Escritório criou
Licença Família = Licença Parental de
6 meses
JAIRO MARQUES – Folha de São Paulo
Maria Clara, que tem previsão de vir ao mundo em julho, nascerá já com um privilégio de raríssimos brasileiros: passar os primeiros seis meses de vida sob os cuidados de papai e mamãe. A empresa onde ambos trabalham criou a “licença família”, que promove direitos iguais de gênero de zelar pelos filhos.
O benefício, que passou a valer em março deste ano (2017), se estende ainda para casais homoafetivos e para funcionários que adotem uma criança, sem restrição de idade.
“Os seis meses para a mãe já é algo natural. Mas chegamos à conclusão que os pais também tinham de ter o direito igual. Os dois são elementos fundamentais da família. A mesma lógica aplicamos para casais gays e para pais adotivos”, afirma Alexandre Pellaes, 42, diretor de gestão de pessoas do escritório ASBZ Advogados.
Pai de trigêmeos de dez anos, dois meninos e uma menina, Pellaes teve cinco dias de licença paternidade, mesmo após os filhos terem nascidos prematuros e tendo de ficar um mês na UTI. Por lei, a licença maternidade deve ser de 120 dias, podendo ser estendida por razões médicas, e a paternidade de cinco dias corridos. Os vencimentos dos funcionários são arcados integralmente pela Previdência Social.
Organizações que aderem ao programa “Empresa Cidadã” podem ampliar o período em 60 dias para a mãe e mais 15 dias para o pai, abatendo o valor no Imposto de Renda. Afora disso, os valores devem ser arcados pelas próprias empresas.
“Os custos da medida são muito bem resolvidos para o escritório. Faz parte do nosso investimento em reforçar o conceito de família e nos colocarmos como meio de transformação social”, declara Pellaes, responsável pela gestão de 250 funcionários.
A reportagem não encontrou referências de concessão de licença paternidade tão longa no país. No Brasil, o Twitter, com base na iniciativa da matriz americana, passou, em 2016, a adotar 20 semanas para que os pais fiquem com os filhos. A Natura oferece o benefício de 40 dias, e outras diversas empresas já dão o benefício de 20 dias. A licença de seis meses para a mulheres também já tem diversos adeptos.
INACREDITÁVEL
Pai de primeira viagem e advogado júnior no ASBZ, Gabriel Frauche Addas, 24, demorou a acreditar que era verdade que poderia ficar seis meses sem ir ao trabalho para ajudar a namorada, Mariana de Oliveira Garrido Reina, 25, também advogada júnior no escritório, no trato e nas boas-vindas a Maria.
“Fiquei até meio sem graça quando meu chefe disse que eu poderia sair por seis meses, mas é a melhor coisa do mundo. O pai junto da mãe, pelo que pesquisei, pode diminuir problemas de timidez, de insegurança no futuro. Sem falar que vou dividir com a mãe os cuidados com a nossa bebê”, declara Addas.
Embora não haja nenhuma contrapartida exigida pela empresa após o retorno da licença, o casal avalia que voltará ao trabalho motivado e tranquilo, uma vez que terão de tempo de organizar a rotina da filha e a nova realidade deles mesmos.
“Estamos muito seguros que não vamos sofrer nenhum prejuízo profissional com a saída. A empresa não faria algo para ser bem vista fora daqui, mas ser questionada internamente. É uma política inovadora e acreditamos nela”, afirma Mariana.
Para o executivo Pellaes, a expectativa da empresa é influenciar outras organizações a enxergarem que “pessoas que trazem resultados são aquelas felizes e com vínculos concretos e positivos com o que fazem”.
“Não achamos que todas as empresas irão sair dando seis meses de licença para seus funcionários, mas, talvez, dois. A chegada de um filho promove uma mudança muito radical em diversos setores da vida e a empresa pode ajudar seus funcionários a se reestabelecerem.”
BENEFÍCIOS
Segundo a pediatra Luciana Silva, presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria, estudos científicos comprovam que os primeiros três anos de vida são “insubstituíveis para o crescimento e para o desenvolvimento” do bebê, o que justifica e torna extremamente necessária a presença contínua dos pais a seu lado por um período.
“Poucas são as empresas privadas que asseguram o tempo necessário para que a mãe possa acompanhar seu filho nos primeiros meses de vida. No caso dos pais, a possibilidade é ainda mais remota. Uma empresa que amplia esses prazos está de parabéns, mas não podemos viver de exceções”, afirma.
Para ela, é preciso que haja uma “regra clara” a ser cumprida por empresas e órgãos públicos. “Defendemos que as mulheres tenham, no mínimo, um ano de licença. O prazo dado aos homens deveria seguir os mesmos critérios, proporcionalmente. Se o Governo quer oferecer saúde e qualidade de vida às futuras gerações deve atuar para que esses parâmetros sejam adotados o mais rápido possível.”
O Ministério da Saúde preconiza, desde 2012, a “paternidade ativa” e faz campanhas e oferece cursos de promoção sobre o papel do pai na criação e educação dos filhos.
Nós do aleitamento.com e
do GT Homens pela Primeira Infância da RNPI
damos total apoio a essa iniciativa e esperamos que outras empresas e governos façam o mesmo
Legenda da foto:
Mariana Reina e Gabriel Addas vão passar primeiros seis meses de vida da filha, Maria Clara, em casa