TÉCNICA de AMAMENTAÇÃO – IMPACTO na AM EXCLUSIVA e LESÕES MAMILARES
Influência da técnica de amamentação nas freqüências de aleitamento materno exclusivo e lesões mamilares no primeiro mês de lactação
The influence of breastfeeding technique on the frequencies of exclusive breastfeeding and nipple trauma in the first month of lactation
J Pediatr (Rio J). 2005;81(4):310-6
Introdução
As taxas de aleitamento materno exclusivo no Brasil estão em ascensão, porém ainda muito baixas, sendo de apenas 23 dias nas capitais (1). Diversos fatores podem estar contribuindo para essa situação, dentre os quais a técnica inadequada de amamentação (2).
É relativamente recente o conhecimento de que o posicionamento adequado da dupla mãe/bebê e a pega/sucção efetiva do bebê favorecem a prática da amamentação exclusiva. Uma posição da mãe e/ou do bebê que dificulta o posicionamento adequado da boca do bebê em relação ao mamilo pode resultar no que se denomina de má pega. Esta, por sua vez, interfere na dinâmica de sucção e extração do leite materno, podendo dificultar o esvaziamento da mama e levar à diminuição da produção do leite. Como conseqüência, a mãe pode introduzir precocemente outros alimentos, contribuindo, assim, para o desmame precoce (2-4). Um estudo mostrou que uma orientação sobre técnica adequada de amamentação na maternidade pode reduzir a incidência de mulheres que relatam baixa produção de leite (5). Além disso, a pega inadequada pode gerar lesões mamilares, causando dor e desconforto para a mãe, o que pode comprometer a continuidade do aleitamento, caso não seja devidamente corrigida(5-7).
É relativamente escasso o número de estudos publicados abordando a técnica de amamentação. No Brasil, foram identificados apenas dois estudos sobre o assunto (8,9). Um dos estudos considerou insatisfatória a mamada em 33% dos recém-nascidos a termo, saudáveis, avaliados nas primeiras 24-48 horas, com mais da metade dos casos devido à forma incorreta do recém-nascido de abocanhar a aréola (8). O outro estudo mostrou que o posicionamento mãe/bebê e a pega do bebê, observados na maternidade, foram satisfatórios em 68 e 82% dos casos, respectivamente (9).
O presente estudo investigou a influência da técnica de amamentação nas freqüências de aleitamento materno exclusivo e na ocorrência de lesões mamilares no primeiro mês de lactação, com a intenção de contribuir para ampliar o conhecimento sobre o assunto, já que são escassas as informações existentes nas literaturas nacional e internacional, como mostrou a ampla pesquisa feita na base de dados MEDLINE, SciELO e Lilacs (sem restrição de data).
Métodos
Este é um estudo de coorte contemporâneo, observacional, envolvendo 211 pares de mães/bebês, selecionados no alojamento conjunto do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, que é um hospital geral universitário cuja clientela é, na sua maioria, usuária do Sistema Único de Saúde. Com uma média de aproximadamente 4.000 partos por ano, o hospital é referência local na área de aleitamento materno, sendo credenciado como Hospital Amigo da Criança desde 1997. Conta com uma equipe de profissionais treinados e capacitados na promoção e manejo do aleitamento materno.
A amostra foi selecionada no período de junho a novembro de 2003. Todos os dias eram sorteados dois pares mães/bebês que preenchiam os seguintes critérios de inclusão no estudo: mães/bebês saudáveis, residentes no município de Porto Alegre e que tivessem iniciado a amamentação; bebês não gemelares, com peso ao nascer maior ou igual a 2.500 g. Foram excluídas do estudo as duplas que, por problemas dos bebês ou de suas mães, tiveram que ser separadas.
Para o cálculo do tamanho da amostra, utilizaram-se os seguintes parâmetros, tendo como base estudo anterior10 e experiência clínica: a = 0,05%; b = 20%; prevalência do desfecho (amamentação exclusiva) entre os não-expostos (duplas com número de parâmetros desfavoráveis menor que a média) = 70%; prevalência da exposição na população = 50%; diferença mínima nas prevalências do desfecho entre os expostos e não-expostos = 20%; Assim, estimou-se, como amostra mínima, 206 duplas mães/bebês.
Foram selecionadas para o estudo 233 duplas mães/bebês, das quais 12 (5%) não participaram por recusa da mãe e 10 (4%) foram perdidas ao longo do acompanhamento, resultando em uma amostra final de 211 pares.
A coleta dos dados foi realizada em três etapas: na maternidade, aos 7 e aos 30 dias de vida do bebê. Os dados foram coletados por uma equipe devidamente treinada, constituída por duas nutricionistas e uma fonoaudióloga (sem vínculo com a maternidade), responsáveis pela seleção da amostra, entrevista com as mães, observação das mamas e avaliação das mamadas no hospital e no domicílio 30 dias após o parto, além de seis acadêmicos de Medicina e Enfermagem, responsáveis pelos dados coletados aos 7 dias nos domicílios. O trabalho foi dividido eqüitativamente entre os membros da equipe. Foi realizado estudo piloto com 20 mães para testar a logística do estudo e os instrumentos de coleta de dados, tendo sido realizados os ajustes necessários.
Na maternidade, entre o segundo e o terceiro dia após o parto, e após assinatura do termo de consentimento informado, as mães eram entrevistadas para a obtenção de informações sociodemográficas sobre o parto, a família e experiências anteriores com aleitamento materno. Após a entrevista, as mamas eram examinadas com o objetivo de detectar lesões mamilares (presença de fissura, bolha, marcas e/ou equimose observadas a olho nu). Após, era feita observação de uma mamada completa, em que eram pesquisados cinco parâmetros indicativos de posicionamento inadequado da mãe/bebê: mãe com ombros tensos, não relaxada; bebê distante da mãe; cabeça e tronco do bebê não alinhados; queixo do bebê não tocando o seio; e bebê não apoiado firmemente, somente ombro e cabeça do bebê apoiados. Pesquisaram-se, também, três parâmetros indicativos de pega inadequada: boca pouco aberta; lábio inferior não virado para fora; e pega não-assimétrica, com mais aréola visível abaixo da boca do bebê. Os itens foram retirados do instrumento de avaliação de mamada difundido pela Organização Mundial de Saúde (11). Para uniformização das avaliações das mamadas, as três pesquisadoras responsáveis por essa tarefa (E.W., M.F. e L.O.) foram devidamente treinadas até atingirem 90% de concordância entre suas observações em todos os parâmetros observados.
Aos 7 dias de vida do bebê, as duplas mães/bebês eram visitadas em seus domicílios para obter informações sobre a alimentação da criança. Aos 30 dias, nova visita domiciliar era feita, ocasião em que eram coletados dados sobre a alimentação da criança (mesmo questionário utilizado aos 7 dias) e era feita nova avaliação de mamada, com a mesma metodologia, pela mesma pesquisadora que havia feito a avaliação na maternidade. Como a amamentação foi interrompida ao longo do primeiro mês em oito pares mães/bebês, a avaliação de mamada aos 30 dias ficou restrita aos 203 pares que continuavam em aleitamento materno.
Conforme recomendação da Organização Mundial de Saúde, foi considerada em aleitamento materno exclusivo a criança que recebia somente leite materno, sem outro líquido ou sólido, incluindo água e chá (12) .
Para a elaboração do banco de dados e das análises estatísticas, foram utilizados os programas Epi-Info, versão 6.04, e o programa estatístico SPSS, versão 10.0. Para assegurar melhor qualidade dos dados, foi realizada dupla digitação dos dados com posterior comparação. Foram comparadas as freqüências dos diversos parâmetros observados durante a amamentação entre as duplas com e sem amamentação exclusiva aos 7 e 30 dias e entre as mães com e sem lesões mamilares na maternidade, utilizando teste do qui-quadrado de Pearson ou qui-quadrado com correção de Yates. Na presença de associação significativa, calculou-se o risco relativo e seus respectivos intervalos de confiança. Foram comparadas, também, as médias do número de parâmetros desfavoráveis à amamentação, tanto para o posicionamento mãe/bebê quanto para a pega do bebê, utilizando-se o teste t de Student para amostras independentes nas comparações intergrupos e o teste t de Student para amostras pareadas nas comparações intragrupos. Adotou-se p < 0,05 como nível crítico e intervalos de confiança de 95%.
O estudo foi aprovado pela Comissão Científica e pela Comissão de Pesquisa e Ética em Saúde do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
Resultados
A Tabela 1 apresenta algumas características das 211 duplas mães/bebês. Observa-se que a amostra foi constituída, na sua maioria, por mulheres adultas, de cor branca, com 8 ou mais anos de escolaridade, que coabitavam com o pai da criança, realizaram mais de cinco consultas pré-natais e tiveram seus filhos de parto normal. A amostra mostrou-se equilibrada quanto ao sexo da criança e à paridade da mãe. Entre as mães que já haviam tido filhos anteriormente, a maioria havia amamentado por mais de 6 meses. Chama a atenção o fato de que poucas mães receberam orientação pré-natal sobre posicionamento e pega na amamentação.
Tabela 1 –
Características das 211 duplas mães/bebês incluídas no estudo – Porto Alegre (RS), 2003
As freqüências de aleitamento materno exclusivo aos 7 e aos 30 dias foram, respectivamente, de 81,5 e 55,9%. As médias do número de parâmetros desfavoráveis relacionados com o posicionamento mãe/bebê e com a pega do bebê na maternidade foram semelhantes no grupo de mães que estava amamentando exclusivamente e no que já não alimentava mais seus filhos unicamente com leite materno, tanto aos 7 quanto aos 30 dias. No entanto, essas médias foram significativamente inferiores (significando uma melhor técnica) aos 30 dias no grupo de mães/bebês em aleitamento materno exclusivo (Tabela 2). Comparando-se as médias do número de parâmetros desfavoráveis na maternidade com as obtidas aos 30 dias, observa-se que as duplas mãe/bebê em amamentação exclusiva aos 30 dias mantiveram, em média, o número de parâmetros de posicionamento desfavoráveis (p = 0,814), mas reduziram substancialmente o número de parâmetros desfavoráveis relacionados à pega do bebê (p < 0,001). Já para o grupo que não estava em amamentação exclusiva, houve um aumento do número de parâmetros desfavoráveis relativos ao posicionamento (p = 0,017), sem mudança do número de parâmetros desfavoráveis relativos à pega (p = 0,227). As tabelas 3 e 4 apresentam as freqüências dos cinco parâmetros relativos ao posicionamento mãe/bebê e dos três parâmetros referentes à pega do bebê observados na maternidade e aos 30 dias, respectivamente, de acordo com o padrão de amamentação aos 7 e 30 dias. Observa-se que nenhum dos parâmetros pesquisados na maternidade se mostrou associado com as freqüências de amamentação aos 7 e 30 dias. Por outro lado, os seguintes parâmetros encontrados aos 30 dias foram significativamente mais freqüentes entre as duplas mães/bebês que já haviam abandonado o aleitamento materno exclusivo: cabeça e tronco do bebê não alinhados (RR = 1,5; IC95% = 1,2-1,9), boca pouco aberta (RR = 2,3; IC95% = 1,3-4,2) e pega não-assimétrica (RR = 1,6; IC95% = 1,3-1,9).
Tabela 2 –
Média (±desvios padrão) do número de parâmetros desfavoráveis relativos ao posicionamento mãe/bebê e à pega do bebê, de acordo com a presença ou ausência de aleitamento materno exclusivo (AME) aos 7 e 30 dias – Porto Alegre (RS), 2003
Tabela 3 –
Freqüência dos parâmetros desfavoráveis relativos ao posicionamento mãe/bebê e à pega do bebê, na maternidade, de acordo com a presença ou ausência de aleitamento materno exclusivo (AME) aos 7 e 30 dias – Porto Alegre (RS), 2003
Tabela 4 –
Freqüência dos parâmetros desfavoráveis relativos ao posicionamento e à pega, observados em 203 mães e bebês aos 30 dias, de acordo com a presença ou ausência de aleitamento materno exclusivo (AME) aos 30 dias – Porto Alegre (RS), 2003
A incidência de lesões mamilares na maternidade foi de 43,6% (92/211). A comparação das médias do número de parâmetros desfavoráveis relativos à pega na maternidade entre as mulheres que apresentaram ou não lesões mamilares revela que não houve diferença quanto a esse aspecto (respectivamente 1,4±0,6 versus 1,5±0,7; p = 0,189). No entanto, o número de parâmetros desfavoráveis relativos ao posicionamento foi significativamente menor (melhor posicionamento) entre as mulheres que apresentaram lesões nos mamilos (1,4±1,2 versus 2,0±1,4; p = 0,04). Como o hospital dispõe de uma equipe especializada no manejo do aleitamento materno, que atende preferencialmente as puérperas que apresentam dificuldades na amamentação, buscou-se a informação sobre o atendimento ou não das duplas incluídas no estudo pela equipe especializada. Verificou-se que 52,2% das mães com lesões mamilares foram atendidas pela equipe especializada antes da avaliação da mamada para esta pesquisa, enquanto 38,7% das que não apresentaram tais lesões tiveram esse atendimento, diferença estatisticamente significativa (p = 0,05).
Discussão
Neste estudo, foram detectadas altas freqüências de parâmetros indicativos de técnica inadequada de amamentação, relacionados ao posicionamento mãe/bebê e à pega do bebê. Em média, cada dupla mãe/bebê apresentou entre um e dois parâmetros relativos ao posicionamento e entre um e dois parâmetros relativos à pega, tanto na maternidade como aos 30 dias. Os parâmetros desfavoráveis mais freqüentes, ocorridos em mais da metade das duplas, foram cabeça e tronco do bebê não alinhados e pega não-assimétrica. Esse último comportamento ocorreu em quase a totalidade da amostra na maternidade e em aproximadamente 90% aos 30 dias. Infelizmente, não é possível fazer comparações com outros estudos, já que não foram encontrados, na revisão bibliográfica, trabalhos que informassem a freqüência dos diversos parâmetros desfavoráveis à amamentação avaliados nesta pesquisa. Embora não especificando os parâmetros desfavoráveis, um estudo realizado em Santos (SP) também encontrou vários comportamentos negativos relacionados à técnica de amamentação (8). Nesse estudo, a média do escore de posicionamento foi 11,5 (de um máximo de 20 pontos atribuídos a 10 parâmetros) e a da pega foi 6,0 (de um máximo de 10 pontos atribuídos a cinco parâmetros), e apenas 0,2% atingiu escore máximo para posicionamento e 2% para pega. Em outro estudo brasileiro, foi relatado que 32% das 50 duplas mães/bebês observadas na maternidade apresentavam dois ou mais comportamentos desfavoráveis relacionados ao posicionamento, e 18% exibiam dois ou mais parâmetros desfavoráveis a uma boa pega (9).
Vários estudos sugerem que uma boa técnica de amamentação nos primeiros dias após o parto está associada com a duração do aleitamento materno. Na Suécia, Righard & Alade (4) observaram que as crianças que tinham pega inadequada (sucção apenas do mamilo) no dia da alta da maternidade tinham chance 10 vezes maior de receber mamadeira no primeiro mês, quando comparadas com as crianças com pega adequada ou que tiveram a sua pega corrigida na maternidade. Aos 4 meses, a prevalência de aleitamento materno era de 40% no primeiro grupo e de 74% nos outros dois. Na Austrália (6), mulheres que receberam orientações quanto ao posicionamento e pega do bebê na 36ª semana de gestação tiveram maior prevalência de aleitamento materno 6 semanas após o parto, quando comparadas com grupo controle (92 versus 29%, respectivamente). Em Bristol (5), Reino Unido, houve aumento significativo nas taxas de aleitamento materno exclusivo com 2 e 6 semanas pós-parto e de aleitamento materno com 2 semanas quando as mulheres recebiam orientação na maternidade sobre a técnica correta de amamentação, quando comparadas com a população de mulheres que tiveram seus filhos no mesmo hospital antes da intervenção. Na Argentina (13), a qualidade da sucção do bebê foi um dos cinco fatores (entre os 26 estudados) associados com a duração do aleitamento materno exclusivo. Contrariando os resultados desses estudos, a presente pesquisa não encontrou associação entre uma melhor técnica de amamentação na maternidade e índices mais favoráveis de aleitamento exclusivo no primeiro mês, ou seja, a técnica de amamentação na maternidade não foi preditiva da prática da amamentação exclusiva. No entanto, observou-se associação significativa entre melhor técnica de amamentação ao final do primeiro mês e maiores índices de aleitamento materno exclusivo na mesma ocasião. As duplas mães/bebês em aleitamento materno exclusivo aos 30 dias apresentaram significativamente um menor número de parâmetros que comprometem a qualidade da técnica de amamentação. Ao longo do primeiro mês, a técnica de amamentação sofreu alterações, com as duplas em amamentação exclusiva apresentando significativa melhora na pega, ao passo que as que já haviam abandonado essa prática apresentaram piora significativa do posicionamento. Entretanto, o delineamento do estudo não permite elucidar se a melhora da técnica favoreceu a manutenção da amamentação exclusiva ou se a interrupção desta, com a introdução de mamadeira, exerceu efeito negativo na técnica. Righard (14) sugere que as crianças com alimentação mista (seio e mamadeira) podem desenvolver uma técnica incorreta de sucção no seio. Algumas dessas crianças usam a língua como pistão ao sugar o seio, comportamento usual na sucção da mamadeira, mas não na sucção do seio. No presente estudo, as crianças não amamentadas exclusivamente (provavelmente fazendo uso de mamadeira) apresentavam, com mais freqüência, boca pouco aberta e pega não-assimétrica, o que pode dificultar a retirada efetiva do leite da mama. Sem esvaziamento adequado da mama, a mulher tende a produzir menos leite, o que pode resultar em necessidade de suplementação láctea da criança, podendo culminar com desmame precoce.
Outro dado que merece destaque é a elevada incidência de lesões mamilares, sendo que aproximadamente metade das puérperas apresentou algum dano mamilar. Esse dado é coerente com o fato de que aproximadamente 25% das crianças tinham boca pouco aberta e, mais relevante ainda, apenas três tinham pega assimétrica. Estudos ultra-sonográficos mostram que, quando o bebê tem pega adequada, o mamilo fica posicionado na parte posterior do palato, protegido da fricção e compressão, o que previne traumas mamilares (15). Diversos estudos (5,6,16) confirmam que a melhora da técnica da amamentação resulta em redução de dor e lesões mamilares. Portanto, era de se esperar que mulheres com lesões mamilares apresentassem um número maior de parâmetros desfavoráveis à amamentação. Paradoxalmente, as mulheres com trauma mamilar apresentaram, em média, menos parâmetros desfavoráveis relativos ao posicionamento do que as que não tinham essa complicação. Cabe, no entanto, referir que as avaliações das mamadas foram feitas no dia da alta das parturientes, desconhecendo-se a técnica nas primeiras mamadas. É muito provável que as mulheres com lesões mamilares tenham melhorado alguns aspectos da técnica durante a sua permanência na maternidade por terem recebido mais orientação, pois o hospital dispõe de um atendimento especializado no manejo da lactação, realizado por profissionais que foram aprovadas no exame para obtenção do título internacional de consultora em lactação conferido pelo IBLCE (International Board of Lactation Consultant Examiners). As profissionais concentram seu trabalho nas mulheres que apresentam dificuldades na amamentação. De fato, foi comprovado que as mulheres com lesões mamilares tiveram esse atendimento especializado com mais freqüência, e isso, provavelmente, influenciou a técnica de amamentação.
Este estudo tem o mérito de ser o primeiro a descrever detalhadamente o posicionamento mãe/bebê e a pega do bebê na amamentação em mulheres brasileiras, detectando elevada freqüência de comportamentos desfavoráveis a uma boa técnica de amamentação, em especial a pega não-assimétrica, apesar de o estudo ter sido realizado em Hospital Amigo da Criança, com equipe especializada em manejo da lactação. Os dados sugerem que as orientações dadas no hospital não são suficientes para modificar o hábito tão arraigado das mulheres no Brasil de, ao amamentarem os seus bebês, apoiarem as cabeças dos mesmos na dobra do cotovelo do braço do mesmo lado da mama a ser oferecida, o que certamente dificulta a pega considerada mais adequada (pega assimétrica). Além disso, acredita-se que, em muitas ocasiões, as orientações são feitas quando o trauma mamilar já se instalou, pois é comum o seu aparecimento já nas primeiras mamadas. Isso reforça a importância de a mulher, já na gestação, ser preparada para amamentar o seu filho de uma maneira que favoreça o posicionamento adequado do mamilo dentro da boca da criança, evitando assim o aparecimento de lesões, que podem ser muito dolorosas.
Este estudo teve alguns cuidados metodológicos, tais como o treinamento das pesquisadoras responsáveis pelas avaliações de mamadas, até que atingissem alta concordância em todos os parâmetros avaliados. Os fatos de as pesquisadoras que realizaram as avaliações das mamadas não terem vínculo com o Hospital em que se realizou a pesquisa e de as avaliações na maternidade e no domicílio para cada dupla mãe/bebê serem realizadas pela mesma pesquisadora certamente contribuíram para a minimização de um possível viés de aferição. O ideal seria se as avaliações de mamadas fossem feitas por duas observadoras independentes, mas não dispúnhamos de recursos humanos suficientes para tal.
Este estudo mostrou que são necessárias ações para melhorar a técnica de amamentação, em especial promover a pega assimétrica, muito pouco praticada, apesar do atendimento especializado na maternidade. Para isso, é importante que sejam testadas estratégias que melhorem a técnica de amamentação desde as primeiras mamadas, bem como seu efeito nas freqüências de complicações decorrentes da amamentação. É possível que, melhorando a técnica de amamentação, as mães possam amamentar com mais conforto, aumentando assim as chances de uma amamentação mais prolongada e prazerosa.
Enilda M. L. Weigert – Nutricionista comunitária, Programa de Saúde da Família, Associação Hospitalar Moinhos de Vento, Porto Alegre, RS.
Elsa R. J. Giugliani – Doutora. Professora, Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Maristela C. T. França – Mestre. Fonoaudióloga, Hospital Nossa Senhora Conceição, Porto Alegre, RS.
Luciana D. de Oliveira – Mestre. Nutricionista. Professora, Departamento de Saúde Coletiva, Fundação Faculdade Federal de Ciências Médicas de Porto Alegre (FFFCMPA), Porto Alegre, RS.
Ana Bonilha – Doutora. Professora adjunta, Escola de Enfermagem, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Lílian C. do Espírito Santo – Mestre. Professora, Escola de Enfermagem, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Celina Valderez F. Köhler – Mestre. Especialista em Saúde Pública. Enfermeira.
* Artigo baseado na dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas: Pediatria-Universidade Federal do Rio Grande do Sul pela primeira autora sob a orientação da segunda autora.
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Elsa R. J. Giugliani
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