Maternidade deixa mulher mais confiante, esperta e rápida
O livro “Inteligência de Mãe” mostra que a maternidade ativa a inteligência das mulheres, tornando-as mais perspicazes para lidar com o acúmulo de atribuições do dia-a-dia. Leitura surpreendente para os não – especialistas.
Inteligência de Mãe põe em evidência as saudáveis transformações pelas quais passa o cérebro materno. As atribuladas mães podem dizer que não têm tempo para ler, mas darão um jeito nisso, pois é envolvente a discussão de como a maternidade as torna, de fato, mais inteligentes. A pesquisa e o relato completos de Ellison dão golpe devastador no estereótipo condescendente de que as mães têm um cérebro disperso. Se a maternidade não tornasse a mulher mais esperta, como aqui está mostrado, a raça humana jamais teria saído da Idade da Pedra.
AMARÍLIS LAGE
FLÁVIA MANTOVANI
da Folha de S.Paulo
Qual a diferença entre uma mulher antes e após a maternidade?
Essa pergunta recebeu, até hoje, respostas pouco lisonjeiras ou, no mínimo, reducionistas. As mães geralmente são vistas como “seres sentimentais”, preocupadas apenas com horários de mamadas e listas de compras no supermercado, e com as quais a conversa costuma se restringir à última travessura do rebento.
Esse perfil, porém, pode ser enterrado. Pesquisas recentes mostram que mães têm melhor desempenho em testes cognitivos, além de um aumento de capacidades sensoriais e de uma maior tolerância ao estresse. Em um levantamento realizado em 2004, nos Estados Unidos, com mulheres que haviam tido filho dois meses antes, uma alta porcentagem delas disse estar menos ansiosa e estressada e capaz de realizar várias tarefas simultâneas com mais habilidade.
Os dados mais significativos nessa área são provenientes de pesquisas feitas com roedores. Uma equipe liderada pelo neurocientista Craig Kinsley, professor da Universidade de Richmond (EUA) que se dedica à questão da maternidade, constatou, por exemplo, que as fêmeas que tinham filhos eram muito mais rápidas para encontrar e capturar presas num cercado.
Nilton Fukuda/F
A farmacêutica Luciana Knobel, 34, que reconhece a presença das filhas pelo olfato
A farmacêutica Luciana Knobel, 34, que reconhece a presença das filhas pelo olfato
As explicações para essas habilidades costumam ser relacionadas a questões evolutivas.Para conseguirem cuidar de seus filhotes e perpetuar a espécie, as fêmeas seriam premiadas com recursos extras. Nesse processo, hormônios reprodutivos como estrógeno, progesterona, prolactina e ocitocina podem ser importantes.
Pesquisas mostram que o estrógeno, cujos níveis disparam durante a gestação, está associado à neurogênese (criação de novas células cerebrais). “Em aves, é bem clara a relação entre o estrógeno e a sobrevida dessas novas células. Em ratos, suspeita-se que ele ajude a regular essa multiplicação”, afirma Cláudio Mello, professor do Instituto de Ciências Neurológicas da Oregon Health and Science University e conselheiro do Instituto Internacional de Neurociência de Natal.O hipocampo é um dos setores do cérebro que mais se beneficiam dessa multiplicação celular. A área está ligada à memória e à aprendizagem.Mas os estímulos vão além dos aspectos biológicos e evolutivos. Os desafios que a criação de um filho impõe também são fundamentais para o desenvolvimento de certas habilidades, como autodomínio e capacidade de realizar várias tarefas ao mesmo tempo. “A experiência é um fator fundamental para a estrutura do cérebro. No caso da maternidade, trata-se de uma experiência multisensorial, que modifica as sinapses”, afirma Cláudio Mello.
Em grande escala
“Por uma combinação de amor, genes, hormônios e prática, o cérebro feminino sofre mudanças concretas no processo de dar à luz e criar os filhos. É uma transformação em tão grande escala quanto a puberdade e a menopausa”, diz a jornalista Katherine Ellison no livro “Inteligência de Mãe”.
Recém-lançada no Brasil, a publicação se baseia em pesquisas e depoimentos de cientistas e de mães para defender uma tese ousada: a de que a maternidade é capaz de deixar as mulheres mais inteligentes.
Segundo a autora, os benefícios que advêm da maternidade podem ser divididos em cinco áreas: percepção, eficiência, motivação, inteligência emocional e resiliência, que consiste na capacidade de superar uma situação ruim e vem sendo associada à ocitocina.
AMAMENTAÇÃO PROTEGE CONTRA O ESTRESSE
Importante para provocar contrações uterinas na hora do parto e para estimular a lactação, a ocitocina é associada a uma diminuição na produção dos “hormônios do estresse”, os glucocorticóides. “O ato de amamentar libera a ocitocina e pode diminuir o risco de depressão pós-parto, por alterar a vulnerabilidade da mulher aos fatores estressores”, diz o psiquiatra Joel Rennó Jr., coordenador-geral do Pró-Mulher, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP (Universidade de São Paulo).
Para o psiquiatra Geraldo Possendoro, pesquisador do departamento de psicobiologia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), faz sentido que as mulheres tenham uma proteção contra o estresse nessa fase da vida. “Se o nível de cortisol [um dos hormônios do estresse] se mantiver alto por muito tempo, pode levar a um prejuízo de funções relacionadas à memória e à abstração, entre outras. Parece que a grávida tem um mecanismo natural de proteção, já que vai ter de cuidar da sua prole”, diz.
Permanência
Esses benefícios podem durar? Para o neurocientista Craig Kinsley, a resposta é sim.
“Examinamos fêmeas de roedores com 24 meses de idade, o que equivale a uma fêmea humana com mais de 70 anos, e descobrimos que aquelas com experiência reprodutiva têm menos depósitos, em seus hipocampos, de uma proteína associada à doença de Alzheimer. Essas mesmas fêmeas se saíram muito melhor em testes de aprendizado e memória ao longo de suas vidas”, disse Kinsley.
Mas a psicóloga evolucionista Maria Emilia Yamamoto, professora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, vê com ressalvas a transposição, para humanos, de dados obtidos com ratos. “Nossos ancestrais e os ratos viviam em ambientes diferentes. A rata precisava sair para caçar e voltar para os filhotes. As mulheres não tinham essa necessidade, pois contavam com o suporte de uma rede social.”
Para o psiquiatra Rennó Jr., a mulher pode ganhar habilidades com a maternidade “desde que esteja disposta, afetivamente, socialmente e culturalmente, a aceitar tais características, que podem ser consolidadas ou não com os filhos”.
Lentidão na gravidez
Por que, então, tantas mulheres se queixam de se sentirem mais lentas e com mais sono nesse período? A questão é polêmica e gerou estudos com resultados contraditórios.
Um trabalho da Royal Postgraduate Medical School, na Inglaterra, descobriu uma redução importante no tamanho do cérebro durante a gravidez –em uma voluntária, essa redução chegou a 7% e voltou ao normal seis meses após o parto.
Já em uma pesquisa realizada por Kinsley, o dissecação de cérebros de ratas no fim da prenhez mostrou que a neurogênese havia sido reduzida, mas que as células nervosas no hipocampo desenvolveram muitas espinhas dendríticas, estruturas que levam à criação de novas sinapses. Após o parto, o cérebro ficou maior que antes.
Segundo o pesquisador, as transformações por que passa o cérebro na gestação são a explicação para a lentidão. “Novas conexões e novos neurônios estão sendo adicionados. Como um espaço em construção, há interrupções, mas o produto final é mais eficiente”, diz.
Rennó Jr. também aponta a interferência dos hormônios, que “inundam” o cérebro da mulher, provocando alterações físicas e comportamentais, e das preocupações com a gravidez. “A capacidade cognitiva pode diminuir devido à dificuldade de concentração, pelo excesso de preocupações.”
Editora: PLANETA DO BRASIL
ISBN: 8576651637
Edição: 1.
Número de páginas: 326
Lançamento: 30/5/2006
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