Amamentação: o sucesso depende de quem?
Gabrielle Gimenez* @gabicbs
Estatisticamente a intenção de amamentar entre as mulheres é bastante alta, mas o índice das que conseguem amamentar efetivamente ainda é baixo. Mas se, do ponto de vista fisiológico, as chances de uma produção de leite insuficiente ou uma contraindicação médica à amamentação são raras, por que isso acontece? A verdade é que muitas mulheres irão se deparar com barreiras no âmbito social, cultural e político, que estarão além do seu controle e que tornarão a missão de amamentar algo praticamente impossível de concretizar.
Então, para a amamentação dar certo não basta só querer, e é muito importante que entendamos isso desde o início. Em primeiro lugar, para não subestimar os obstáculos que teremos pela frente, e que aparecerão em todas as partes. E em segundo lugar, para quebrar o ciclo de culpa que as mulheres carregamos pelas nossas experiências frustradas de amamentação. As mulheres dão o peito, mas elas não amamentam sozinhas. Nosso desejo e força de vontade, muitas vezes não são o bastante.
Esse entendimento é fundamental para que possamos identificar os verdadeiros inimigos nessa jornada, e assim não dirigirmos nossa fúria contra outras mulheres que amamentam ou contra quem difunde a informação que pode transformar essa realidade. A informação às vezes toca em feridas profundas, e pensamos que a pessoa que a comunica o faz para nos ferir e jogar na nossa cara o nosso fracasso. Mas lembre-se, esse fracasso não é seu.
Não podemos deixar de falar sobre a amamentação e permitir que se transforme de vez em tabu, sob a desculpa de não causar desconforto em quem não conseguiu amamentar. E não me refiro apenas aos seus benefícios. Porque se nosso discurso ficar apenas nisso, parece que queremos vender um conto de fadas sem qualquer relação com a realidade.
Precisamos falar sobre os riscos do aleitamento artificial, sobre desmames compulsórios, iatrogênicos e comerciogênicos. Sobre a indústria e suas múltiplas maneiras de burlar a lei para continuar vendendo seus produtos sob a premissa disfarçada de serem “melhor que o nosso leite fraco”. Sobre o conflito de interesses das associações médicas e dos profissionais da saúde. Sobre a necessidade de leis mais efetivas na proteção da amamentação e da maternidade. Sobre investimento em saúde pública, campanhas e programas de promoção da saúde e amamentação, não dirigidos apenas às mulheres, mas à sociedade em todas as suas esferas. Ah, precisamos falar de tanta coisa! E há tanto ainda por fazer!
A proteção à amamentação será o tema da Semana Mundial de Aleitamento Materno deste ano. E essa é uma responsabilidade que deve ser compartilhada por TODOS. Embora o apoio individual à amamentação seja importante, apenas quando, como sociedade, começarmos a considerá-la como uma questão de saúde pública digna de investimento, poderemos alcançar as mudanças culturais necessárias para trazer a amamentação de volta ao seu estado de normalidade, própria da espécie humana. E quem sabe então, o índice de mulheres que amamentam chegue a estar mais próximo do índice daquelas que desejam amamentar.
*Gabrielle mãe de três filhos é Editora especial do portal aleitamento.com, uma das conferencistas do
Seminário “Proteger a Amamentação – SMAM 2021”
e autora do livro “Leite Fraco”.
Seminário: programa, conferencistas, inscrições em www.agostodourado.com