PREMATUROS merecem sua atenção e cuidado
Nossos cuidadores,
Nossas cuidadoras,
Pedimos permissão para usar um pedacinho do seu tempo para falar de algumas coisas que precisam ser ditas a nosso respeito que envolvem o modo como nós e nossas famílias temos sido tratados nos últimos dois séculos.
Somos hoje quinze milhões que nascem a cada ano no mundo
Colocamos o Brasil em decimo lugar no mundo em número de bebes que nascem como nós nascemos.
Somos quase trezentos mil que nascem a cada ano entre os brasileiros.
Quase 10% de todos os nascimentos somos nós.
Estamos formando uma pequena grande nação de pequeninos, e é por isso que pedimos sua atenção para o que temos a dizer.
Podem continuar, se assim desejarem, chamando a gente de prematuros, como se fossemos uma coisa a parte, uma entidade distinta, mas nunca se esqueçam de que desde o primeiro instante em que a vida nos toca com sua presença, já trazemos em nós as características do homem velho que nascemos para nos tornar um dia.
Representamos a espécie humana de forma tão honrosa e integral como qualquer bebe nascido no tempo esperado para ser representa.
Por isso estamos aqui.
Para fazer chegar até vocês esse nosso manifesto.
Uma manifestação pacifica e ordeira, mas que não significa em absoluto que sejamos passivos e desprovidos de vontade e sentimentos, que não tenhamos coração.
Não.
Até porque é com o coração em festa que agradecemos, nossos cuidadores, nossas cuidadoras, o empenho de seu trabalho que tem permitido a muitos de nós com peso de nascimento e condições clinicas antes incompatíveis com a vida, receber a chance de sobreviver e crescer como verdadeiros filhos da mesma humanidade.
Somos gratos por seu empenho, seu estudo, sua dedicação e sua evolução tecnológica cada vez mais apurada para nosso bem estar.
É por isso que nosso movimento não é só pelas 20 graminhas de ganho de peso diário.
Não é só pelas 20 graminhas que nós estamos aqui.
É pelo leite materno.
É pelo colo materno.
É pela presença materna que queremos perto de nós como seus canguruzinhos, como éramos dentro do seu ventre.
É pelo direito de estar ao lado de nossa mãezinha, porque, nossos cuidadores, nossas cuidadoras, ainda que às vezes isso passe despercebido aos olhos de muitos, somos e seremos e queremos sempre ser reconhecidos e tratados como seus filhos.
Por isso viemos aqui pra dizer quando é que as UTIs Neonatais não nos representam.
Não nos representam quando nos condenam ao exilio familiar, longe da presença dos pais e irmãos e dos avós que temos.
Não nos representam quando não se preocupam em agrupar os cuidados programados para nossa recuperação e nos submetem a um sem numero de manipulações intempestivas e sem sincronia, perturbando irresponsavelmente nosso sono restaurador e prejudicando nosso desenvolvimento neuro-emocional de maneira perigosa.
Não nos representam quando não facilitam a amamentação, dificultando nosso contato com o peito nas vezes quando ainda não chegamos ao peso de 1800 gramas, como se um de nós com 1400 gramas ou até menos, por exemplo não pudesse conhecer o seio materno, o que não se justifica, convenhamos.
Não, nossos cuidadores, nossas cuidadoras, essas UTIs não nos representam.
Sabem por que?
Porque queremos UTIs Neonatais padrão FIFA:
Queremos UTIs que cuidem de nós mas que não se esqueçam de nossas mãezinhas e de nossa família, que vivem a crise de nossa internação de forma tão dolorosa quanto a nossa e, como nós muitas vezes somos, também são relegadas a um segundo plano de cuidado sem que a Unidade tenha um plano que os inclua na sua linha de atenção.
Em plena Semana Mundial de Aleitamento Materno soa hipocrisia demais falar de amamentação em prematuros ao mesmo tempo em que se esquece de apoiar e exigir de nossos legisladores uma compensação da licença maternidade para a mãe prematura conhecida como a Lei do Prematuro a fim de permitir a ela uma tentativa de equiparação com a mãe que teve seu filho no tempo esperado, aumentando suas chances de amamentar, concordam comigo?
Assim, nossos cuidadores, nosso movimento é pacifico e ordeiro, mas é firme, com os pés no chão e o coração nos sonhos de dias melhores para quinze milhões de nós em todo o planeta…
Saibam todos que não somos anônimos, como muitas vezes nos identificam, rotulando-nos com o número do nosso leito, a condição clinica que apresentamos ou simplesmente com o nome de nossa mãeznha, porque as vezes parece que é só nessa hora que muitos lembram dela.
Nós não precisamos de MAIS MÉDICOS, meus queridos.
Precisamos de mais respeito.
Precisamos de mais profissionais que saibam entender cada vez mais nossos sinais de stress e preveni-los, porque muitas vezes não temos a força de um Davi para enfrentar um gigante tão grande quanto o ambiente estressante de uma UTI.
Precisamos que de dentro da casa de acrílico cercada de bips por todos os lados onde nos alojam, tenhamos nossos sinais de aproximação e afastamento percebidos e respeitados, tornando contigente o cuidado a nós oferecido e respeitoso o ambiente para nós preparado.
Vandalismo é nos exilar para longe de nossa família.
Vandalismo é nos inundar de luz ininterrupta e intensa, som estrondoso e perturbador, dor não prevenida, stress não percebido, toque desnecessário, comunicação inexistente…
Vandalismo é cuidar da gente como se nós nos resumíssemos a um conjunto de diagnósticos, a uma pedaço de carne com necessidade de medicamentos e não tivéssemos nem sentíssemos saudade, tristeza, solidão, alegria, sono, satisfação, bem estar ou vontade própria…
Queremos definitivamente que nossos cuidadores nunca se esqueçam que somos infinitamente agradecidos pela vida que eles nos devolvem preservada, mas imploramos que eles não se contentem com isso e nem se acomodem ai, porque mais que sobreviver, nós queremos ter a chance de sorrir, amar, ser feliz e não perder nunca a capacidade de sonhar.
É pacifico e ordeiro nosso manifesto.
Mas alertamos: se não formos atendidos nas nossas justas proposições, saberemos reivindicar nossos direitos no grito:
Buáaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa
Luis Tavares
Campos RJ