Summary
A prematuridade bateu à porta no dia 04 de junho de 2015. Eu estava com 34+6 semanas de gestação, à espera dos gêmeos Matias e Beatriz. Embora já tivesse um filho mais velho, ser mãe de prematuros me fez voltar a me sentir como mãe de primeira viagem. Tudo era tão diferente da primeira vez! Afirma Gabrielle Gimenez.
Gabrielle Gimenez*
O nosso calendário anual é repleto de datas que visam chamar a nossa atenção para os cuidados com a saúde, tanto na prevenção de doenças e medidas para melhores prognósticos, quanto na conscientização sobre os mais diversos quadros, síndromes, transtornos no desenvolvimento, entre outros. Mas nada como viver na pele uma experiência para começar a olhar para um dia de conscientização com outros olhos.
A prematuridade bateu à porta no dia 04 de junho de 2015. Eu estava com 34+6 semanas de gestação, à espera dos gêmeos Matias e Beatriz. Embora já tivesse um filho mais velho, ser mãe de prematuros me fez voltar a me sentir como mãe de primeira viagem. Tudo era tão diferente da primeira vez!
Um breve relato pessoal
Beatriz era a candidata ideal para não escapar da UTI Neonatal protocolar por ser menor de 35 semanas e baixo-peso. Mas munidos de informação e muita determinação conseguimos trazê-la para o quarto e não nos separamos mais. Vencemos controles glicêmicos e fototerapia à base de colostro e leite de transição, até recebermos a alta hospitalar sete dias mais tarde.
Já o Matias nasceu com desconforto respiratório e precisamos ser separados depois do parto. Foram quatro dias de observação na UTI Neo, com contato restrito e visitas controladas, que pareceram eternos. Chorei cada vez em que fui obrigada a deixá-lo na incubadora para voltar correndo ao quarto do hospital porque Beatriz me esperava. Não havia lactário (muito menos um Banco de Leite Humano), a equipe nem sempre me esperava chegar e ele recebeu algumas dietas de leite artificial na sonda, apesar do meu esforço em ordenhar o colostro e querer amamentar. Mas eu estava cansada demais para brigar por isso, e eu tinha outro bebê para cuidar e alimentar e que, pelo baixo peso e a fototerapia, corria risco de ir para a UTI a qualquer momento.
Não posso explicar a emoção de quando o Matias finalmente recebeu alta da UTI e subiu para o quarto trazido pela enfermeira. Logo depois veio para o peito e daquele momento em diante nunca mais nos separamos, nem tivemos mais contato com leite artificial. Foi puro peito pelo tempo que eles quiseram.
Recomendações da OMS em 2022
Na última terça-feira, a Organização Mundial da Saúde (OMS) voltou a apresentar novas diretrizes para melhorar as chances de sobrevivência e resultados de saúde de bebês nascidos prematuramente (antes de 37 semanas de gestação) ou pequenos (menos de 2,5 kg ao nascer). Mais do que trazer “novidades”, o que vemos é o apelo a que as práticas, sabidamente benéficas para esse grupo, sejam abraçadas por todas as instituições e profissionais responsáveis pelo cuidado do prematuro o quanto antes.
Pelas novas diretrizes, o contato pele a pele com o cuidador, conhecido como “Metodologia Mãe Canguru”, deve ocorrer imediatamente após o nascimento, em vez de dedicar a primeira fase após o nascimento aos cuidados da incubadora. Este procedimento representa uma mudança significativa em relação à orientação anterior e à prática clínica habitualmente praticada.
Continua recomendando-se fortemente a amamentação para melhorar os resultados de saúde de bebês prematuros e com baixo peso ao nascer. Em ambos os casos é crescente o corpo de evidências demonstrando seus imensos benefícios e a redução dos riscos de infecção em comparação com a alimentação com fórmula para bebês.
As diretrizes também defendem o fortalecimento do apoio emocional e financeiro oferecido aos cuidadores, o que inclui a necessidade de licença parental remunerada e suporte no local de trabalho.
Segundo o próprio diretor-geral da OMS, Dr. Tedros Adhanom, “as diretrizes mostram que melhorar os resultados para esses bebês nem sempre significa encontrar soluções com base na tecnologia mais recente, mas garantir o acesso a cuidados de saúde essenciais focados nas necessidades das famílias”.
Teoria x Realidade
Conforme os dados divulgados pela OMS, 15 milhões de bebês nascem prematuramente a cada ano, representando mais de um em cada dez bebês nascidos no mundo, e um número ainda maior de bebês (mais de 20 milhões) têm baixo peso ao nascer. Sendo este, portanto, um problema urgente de saúde pública.
Mas pese a toda a evidência disponível e aos mais de 40 anos de existência da “Metodologia Madre-Canguro”, a realidade que a maioria das famílias de prematuros vivencia ainda está longe do ideal preconizado pelas diretrizes.
Precisamos inegavelmente de melhores protocolos hospitalares, que incluam a prática da tecnologia Mãe Canguru e, que respeitem as recomendações da OMS-UNICEF em relação à promoção e proteção da amamentação desde o nascimento. Isso certamente fará toda a diferença não apenas na diminuição das taxas de mortalidade e de desmames precoces, mas também melhorando a qualidade do vínculo e de vida do prematuro a curto, médio e longo prazos.
Prematuridade e amamentação não são incompatíveis.
Ninguém nunca me disse isso. E se conseguimos a amamentação exclusiva foi porque corri atrás de informação e recebi apoio nos grupos de pares. Porque por parte dos profissionais que cruzaram o nosso caminho não houve apoio ou contribuição alguma.
O leite materno é padrão ouro de alimentação para qualquer bebê, mas para os prematuros sua importância é ainda mais categórica. É preciso melhorar a formação dos profissionais reforçando o leite da mãe prematura como fonte ideal de alimento para o bebê prematuro. Precisamos que a informação correta chegue a um maior número de pessoas e famílias, lhes dando o poder de questionar e exigir melhor atenção médico-hospitalar e apoio concreto e atualizado à amamentação.
“Bebês prematuros podem sobreviver, prosperar e mudar o mundo, mas todo bebê deve ter essa oportunidade”.
Tedros Adhanom, Diretor-geral da OMS.
* Gabrielle – @gabicbs é Puericultora, mãe de três, editora especial do portal aleitamento.com e autora do livro “Leite Fraco? – Guia prático para uma amamentação sem mitos”.