Por que regular o marketing de alimentos para crianças?
Em países como o Brasil, a maioria dos anúncios publicitários trata de alimentos com elevados teores em calorias e pobres em vitaminas. Regular a propaganda desses produtos pode ajudar no desenvolvimento de hábitos saudáveis de alimentação entre as crianças. Em vários países, diversas companhias de alimentos têm concordado em parar com anúncios dirigidos aos menores de 12 anos.
Corinna Hawkes
Em todo o mundo, a propaganda de alimentos, especialmente os anúncios voltados para crianças, transformou-se numa importante ferramenta para os grandes negócios. No Brasil, como em qualquer outro lugar, a maioria dos comercias trata de alimentos energeticamente densos, elevados em calorias – biscoitos, doces, chocolates, batatas fritas –, que geralmente também são pobres em vitaminas e minerais. Crianças gostam desses anúncios, e consomem prontamente os produtos anunciados.
Numa pesquisa com crianças entre 6 e 13 anos, 70% mostraram interesse em provar estes alimentos depois de assistirem à propaganda na televisão. De 40 a 66% das crianças haviam consumido pelo menos um produto anunciado no dia anterior e 75% das crianças compraram os alimentos anunciados na TV com ofertas de brindes ou prêmios. Os percentuais são ainda maiores entre crianças dos grupos com menor renda e escolaridade.
Vale lembrar que as crianças não são alvos da propaganda somente na televisão, mas nas revistas, na Internet, nas escolas e são explicitamente alvos de vendas promocionais. Em todo o mundo, companhias inventam maneiras cada vez mais criativas de incentivar as crianças a consumir seus produtos.
Qual é o problema disso? Propagandas e outras formas de promoção são parte de nossa cultura comercial, uma questão fundamental dos princípios econômicos onde as marcas competem por atenção. Mas há valores sociais importantes que precisam ser levados em conta, e um deles é a proteção à saúde. Uma alimentação pouco saudável pode resultar numa maior probabilidade de sobrepeso e obesidade. Ou seja, as crianças que se alimentam mal estão mais propensas a se tornarem adultos com sobrepeso e obesidade.
De acordo com o Instituto Nacional da Saúde dos Estados Unidos, este é um sério problema de saúde. As pessoas acima do peso são quatro vezes mais propensas a diabetes tipo 2, duas vezes mais propensas a desenvolver hipertensão, três vezes mais propensas à doença cardíaca coronariana, duas vezes mais propensas um sofrerem um ataque isquêmico e têm incidência mais elevada de cálculos biliares, desordens do sono, câncer de colo, câncer de mama em mulheres mais velhas, câncer endometrial, transtornos alimentares e problemas emocionais.
É certo que a propaganda e outras formas de promoção comercial não podem ser responsabilizadas por tudo isto, mas elas favorecem um ambiente no qual se torna mais difícil incentivar meninos e meninas a se alimentarem de forma mais saudável.
A boa notícia é que algo pode ser feito para enfrentar tal problema. Na Europa e nos Estados Unidos, diferentes abordagens vêm sendo testadas para regular o marketing dos alimentos ricos em gorduras, açúcares e sal às crianças. Diversas das principais companhias de alimentos têm concordado voluntariamente em parar de alvejar anúncios aos menores de 12 anos. Anunciados recentemente nos Estados Unidos, ainda não é certo se esses acordos serão aplicados no Brasil, e como serão monitorados e reforçados/executados.
No país, a tentativa conhecida como “auto-regulação” representa uma prática de funcionamento da indústria de publicidade de se auto-policiar. Isto envolve o desenvolvimento de um código que enfatize que as propagandas não devem ser enganosas ou ilusórias, código este reforçado e implementado por uma organização auto-regulatória. A organização pode pedir que os publicitários modifiquem ou retirem suas propagandas caso violem o código. No caso em questão, a auto-regulação da publicidade pode considerar se as propagandas dos alimentos incentivam comportamentos insalubres de acordo com seu código padrão. Assim, pode fazer alguma diferença.
A questão é que, apesar de ajudar a impedir as propagandas que enganam as crianças sobre a qualidade de um ou outro alimento, a auto-regulamentação não pode impedir que as crianças sejam bombardeadas com tantos tipos de propagandas diferentes, uma após a outra. Outra limitação da auto-regulação é que os códigos tendem a cobrir somente propagandas na televisão – não todas as outras técnicas de marketing usadas para atingir crianças.
Restrições legais à propaganda dirigida às crianças estiveram em vigor por muito tempo na Suécia e também em Quebec, a região de língua francesa no Canadá. Em Quebec, nenhuma propaganda dirigida às crianças foi permitida desde 1980. O sistema provou ser completamente fácil de administrar, porque existem regras claras sobre o que é e o que não é permitido. Além disso, a opinião pública geralmente é contra a propaganda dirigida às crianças, o que implica numa pressão contra a indústria de alimentos para não violar a lei.
Um dos argumentos contra a restrição de propaganda às crianças é que as empresas de mídia perderão uma fonte de renda valiosa, o que significaria uma programação de pior qualidade e menor rendimento para financiar programas infantis de televisão (marketeiros pagam caro para promover seus produtos na televisão e em outros meios). Contudo, o exemplo de Quebec mostra que este não deve ser um problema: ao invés de atingir crianças, os marketeiros em Quebec preferem veicular anúncios de produtos de limpeza, que são de maior interesse aos adultos que assistem televisão com suas crianças. Após 25 anos, a lei em Quebec não impediu que as redes de televisão gerem renda e façam programas. O Tribunal Superior do Canadá estabeleceu também que a restrição de informações comerciais às crianças não viola a liberdade de expressão.
Em síntese, o marketing de alimentos às crianças é apenas um dos fatores que afeta os hábitos alimentares dos meninos e meninas. Mas regulá-lo é uma das ações concretas que podem ser feitas para que se tenha um ambiente de suporte ao desenvolvimento de hábitos saudáveis entre crianças. Isso é particularmente importante em países como o Brasil, onde as indústrias de alimentos estão tentando encontrar novos mercados, uma vez que as oportunidades de crescimento na Europa na América do Norte se tornam mais e mais limitadas.
Corinna Hawkes dirige o programa de pesquisa em qualidade e mudança dos padrões de alimentação no International Food Policy Research Institute (IFPRI – www.ifpri.org), de Washington (EUA). Foi consultora da Organização Mundial da Saúde (OMS) e é autora do estudo “Marketing Food to Children: The Global Environment”, que aborda, entre outros assuntos, a regulamentação da publicidade na TV e comercialização de alimentos em ambientes escolares em diversos países.
No BRASIL há legislação que protege os
lactentes de interesses comerciais
Da Assessoria, O Documento – Várzea Grande,MT,Brasil
A Norma brasileira para comercialização de alimentos para lactentes e crianças de primeira infância será incluída nas visitas de rotina da Vigilância Sanitária de Várzea Grande em caráter educativo. Os alvos dos fiscais desta vez serão chupetas, mamadeiras, papinhas e alimentos para crianças de até três anos de idade. “Muita gente não sabe, mas esses produtos precisam seguir normas rígidas para a venda, além de cuidados que devem ser notados nos rótulos das embalagens”, alerta a gerente de Vigilância Sanitária de Várzea Grande, Rosimeire de Oliveira.
A Vigilância orienta que além do selo do Inmetro, eles devem conter, entre outras informações, o nome do fabricante, o importador ou o distribuidor; a identificação do lote com data de fabricação; as instruções para o uso correto e seguro dos produtos. “A chupeta, por exemplo, deve ser fervida por pelo menos cinco minutos antes de cada uso, não deve ter laços ou fitas para prender no pescoço da criança, para evitar o risco de estrangulamento. O furo do bico da mamadeira já vem na medida exata. Não há a necessidade de aumentar porque pode asfixiar o bebê”, explica Rosimeire.
A lei proíbe que se faça propaganda desses produtos em qualquer meio de comunicação. Também não pode haver promoção de venda ou distribuição de amostras grátis. Os rótulos têm de conter a advertência do Ministério da Saúde. No caso das chupetas e mamadeira tem que estar escrito que o bebê que mama no peito não precisa disso e que o uso desses produtos pode prejudicar a dentição e a fala da criança.
De acordo com a gerente, a Lei nº 11.265, de 3 de janeiro de 2006 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, tenta proteger o aleitamento de interesses comerciais. “A lei proíbe, por exemplo, a propaganda de produtos destinados à substituição total ou parcial do leite materno na alimentação de crianças até os seis meses de idade e compostos de nutrientes para recém-nascidos prematuros ou de alto risco. Até o sexto mês de vida, todos os nutrientes de que o bebê necessita para crescer forte e sadio estão no leite materno. O leite protege a criança contra doenças e ainda fortalece os laços entre mãe e filho”, explica a gerente que também é enfermeira.
Nas lojas e farmácias os fiscais também vão verificar se há irregularidades e se elas foram cometidas pelos comerciantes ou pelas indústrias. Estabelecimentos de saúde e empresas que não se adequarem à lei poderão ser multados ou até impedidos de comercializar os produtos. “Nesse momento estão previstas ações simplesmente para orientação. Depois de passado o prazo para adequação das indústrias, serão adotados procedimentos punitivos”, avisou a gerente.
LEI
Este ano, o Brasil comemora 25 anos da Política Nacional de Aleitamento Materno, que já promoveu diversos avanços na área. Dentre essas ações está a lei federal 11.265/06. A elaboração do texto agregou elementos da Norma Brasileira de Comercialização de Alimentos para Lactentes e Crianças de Primeira Infância, Bicos, Chupetas e Mamadeiras (NBCAL) – regulamentação da propaganda de produtos que interferem na amamentação como chupetas, bicos e mamadeiras.
“A publicação desta lei que transforma um conjunto de resoluções e normas – uma portaria ministerial e dois regulamentos da ANVISA, em lei, é um grande avanço. Isso significa dizer que o conjunto de regulamentos que tínhamos e que viemos conformando desde 1988 tem tanta força como, por exemplo, o Estatuto da Criança e do Adolescente”, disse Rosimeire, em referência a portaria 2051 e as resoluções 221 e 222, ambos do Ministério da Saúde.
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