Por que médicos e pacientes optam pela cesariana?
A cesariana é uma técnica cirúrgica que consiste na extração do feto através de uma incisão nas paredes abdominal e uterina. Geralmente, é empregada em situações em que o bebê e/ou a mãe estejam em risco ou quando o trabalho de parto é contraindicado.
Porém, essa técnica passou a ser utilizada de maneira abusiva nas maternidades brasileiras, ocasionando aumento nos índices de morbi-mortalidade materna e perinatal.
Em função disto, o obstetra Marcos Augusto Dias, doutor em Saúde da Criança e da Mulher pelo Instituto Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz), buscou explicar, na pesquisa
Cesariana: epidemia desnecessária?,
quais os mecanismos que levam o obstetra a decidir pela indicação da cesariana.
Morte materna e complicações
Segundo Dias, apesar de antiga – relatos mostram que a primeira cesárea data de 1500 e foi feita por um açougueiro suíço em sua mulher -, a cesariana costumava ser um procedimento raro, comumente associado a altas taxas de mortalidade.
Entretanto, nos últimos anos, os índices de partos por cesárea no Brasil têm ultrapassado o limite recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), tornando-se foco de atenção devido ao aumento do número de mortes materna e fetal e às diversas complicações ocasionadas, que vão desde uma simples febre até uma enorme perda de sangue.
Atualmente, as taxas brasileiras de cesarianas são consideradas as maiores do mundo, e a cirurgia é vista de forma tão banalizada que chega a atingir 80% dos partos. No município do Rio de Janeiro, o número passou de 41,2%, em 1993, para 46,9% em 1996. “Nos dias de hoje, tanto o Brasil quanto o Rio de Janeiro apresentam taxas em torno de 50%”, afirma o pesquisador.
A cesariana, além de gerar gastos financeiros desnecessários para as unidades de saúde, pode colocar em risco a saúde da mulher e do recém-nascido.
Conforto dos médicos
De acordo com Dias, as taxas de cesariana vêm aumentando em todo o mundo, mas, no Brasil, alcançam níveis impensáveis para os países desenvolvidos.
Ele explica que esse aumento está associado a diversos fatores, como o conforto do médico, que pode programar suas atividades sem comprometer sua renda e vida pessoal; deficiências na formação dos obstetras em relação à assistência ao parto normal; e a pouca valorização dos riscos maternos e neonatais durante e após a cirurgia.
Outro elemento determinante é que, culturalmente, a cesárea alcançou grande aceitação entre as mulheres brasileiras, especialmente nas classes socioeconômicas mais elevadas.
“Sofrimento” do parto
O surgimento das técnicas de antissepsia, anestesia, reposição sanguínea e o uso de medicamentos intravenosos e da antibioticoterapia contribuíram para diminuir as altas taxas de mortalidade, tornando a cesariana uma alternativa segura ao parto normal.
Porém, os recursos oriundos do avanço da medicina fizeram com que essa técnica passasse a ser adotada de forma indiscriminada em quase todos os hospitais. Dias explica que o número de cesáreas é muito maior nos estabelecimentos privados, onde, teoricamente, as mulheres possuem um nível de instrução maior.
“Isto faz surgir a hipótese, já levantada por muitos autores, de que a cesárea pode ter-se transformado em um bem de consumo para as classes mais altas da população.
Na rede pública, um motivo para muitas mulheres optarem pela cesariana é não ter de passar pelo sofrimento do parto normal, já que histórias de maus tratos e violência são frequentes em maternidades de diversas unidades de saúde”, ressalta o médico.
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