Ricardo Herbert Jones* em entrevista a Revista Pais & Filhos de Portugal
afirma:
O SUCESSO da AMAMENTAÇÃO começa na ATENÇÃO ao PARTO
P&F – Há dois anos afirmava numa entrevista à Pais&Filhos, que existiam sinais de evolução em prol do parto humanizado, tanto na formação da classe médica como na percepção deste conceito junto da opinião pública. Que desenvolvimentos ocorreram desde essa altura? Durante este período, o parto humanizado ganhou terreno a nível global, em especial nos países ditos mais desenvolvidos a nível dos sistemas de saúde?
RHJ – Existem sinais inequívocos de uma lenta e consistente modificação na cultura do parto. Em países onde o debate acerca do tema “nascimento humanizado” é mais livre e estimulado, como no Reino Unido e outros países da Europa, observamos um aumento significativo na incidência de partos domiciliares. Nos Estados Unidos também ocorreu um fenômeno semelhante, indicado pelas últimas estatísticas publicadas. No meu país, o Brasil, o mesmo fenômeno pode ser observado, mas as estatísticas não são ainda confiáveis, até porque em um país de desigualdades como o nosso confunde-se ainda “parto domiciliar planejado” com “parto desassistido”. Infelizmente ambos aparecem abaixo da mesma categoria: “parto não hospitalar”, onde não se discrimina aqueles que foram assim realizados por escolha ou por imposição. Este tipo de movimento em direção ao parto fora do hospital denuncia um desejo de que o nascimento seja cercado de outros valores do que apenas o cuidado tecnológico que o hospital se propõe a oferecer. É um sinalizador de que as pessoas – e principalmente as mulheres – desejam mudanças substantivas na assistência ao parto. Mães e bebés querem mais para si. Por outro lado existem outros sinais, além das frias estatísticas, que nos demonstram que o nascimento humanizado está participando ativamente do debate nacional. Entidades médicas como a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), o Conselho Federal de Medicina (CFM), além da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e a própria Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) estão se mobilizando com o objetivo de incentivar o parto normal. Uma das soluções encontrada para isso foi criar um pacote de medidas para oferecer mais conforto e segurança à gestante que optar por essa modalidade. Na prática, todas as maternidades do País, públicas ou privadas, terão de se adaptar às novas regras. Estas normativas incluem uma melhoria na assistência oferecida às gestantes, para que elas se sintam amparadas quando optarem pelo parto normal. Entre as modificações incluídas no “pacote” estão a criação de quartos individuais e com espaço para um acompanhante, cujas despesas serão incluídas na conta das operadoras de saúde. Mais além do que simples alterações arquitetônicas em centros obstétricos, as maternidades deverão oferecer métodos alternativos para aliviar a dor da gestante durante a espera do parto, investindo também no fortalecimento dos vínculos entre mãe e filho desde os primeiros instantes de vida. É apenas uma questão de tempo para que legislações deste tipo sejam propostas e instituídas também em outros países, produzindo mudanças substanciais no atendimento às grávidas e suas famílias. Em Portugal existem exemplos positivos, como as alterações realizadas na cidade do Porto, no Hospital São João, entre outras iniciativas.
Outra forma de medir a importância de uma determinada questão na sociedade é verificar como ela se manifesta na arte, no cinema, na literatura e na televisão. As novelas no Brasil, assim como em outros países, ocupam um lugar de destaque na maneira das pessoas se posicionarem diante dos problemas do cotidiano. Assim, cada novela investe em uma polêmica em especial: algumas trataram de temas como o alcoolismo, drogas, violência familiar, racismo, casamento gay, etc. Na última novela de horário nobre, chamada “A Favorita” uma personagem dá à luz em casa, amparada por uma parteira, e de cócoras. Imediatamente setores distintos da sociedade se manifestaram, oportunizando um amplo debate sobre o direito de escolha, a segurança, a “modernidade” ou o “atraso” desta opção, os aspectos emocionais, etc.. A simples presença deste evento na trama televisiva é a demonstração de que a humanização do nascimento – e o largo espectro de modificações que ela impõe – está na ordem do dia, fazendo que os responsáveis pela novela coloquem esta discussão no folhetim mais visto no país.
Na cultura médica também percebemos lentas modificações. Há alguns poucos anos no Brasil não se sabia o que eram doulas e o que faziam; hoje, poucos são os profissionais de saúde que ainda ignoram a ação destas mulheres durante o trabalho de parto. Em Portugal estamos realizando o II congresso Internacional de Humanização do Nascimento, sob a liderança da HumPar, que foi criada há menos de três anos. Hoje esta instituição, da qual tenho a honra de ser consultor médico, conquistou um espaço no debate sobre os rumos da assistência ao nascimento em Portugal. Aqui já existem dezenas de doulas e educadoras perinatais que oferecem suporte às gestantes, atendendo em várias cidades do país. Na Internet, há poucos anos passados, quase não havia fotografias ou vídeos de partos humanizados, seja na água, com o apoio do companheiro, em casas de parto ou no domicílio. Hoje, ao contrário, existe uma explosão de imagens de parto no “Youtube”, mostrando que muito mais pessoas se interessam e se sensibilizam pelas vantagens de ter um parto com segurança e de acordo com seus desejos. Não há dúvida do crescimento desta idéia, mas existe também a certeza de que muito ainda há para se modificar se quisermos restituir o pleno protagonismo feminino no parto. Se existem motivos para a preocupação com o modo como mulheres e recém nascidos ainda são tratados no mundo inteiro, existem também razões de sobra para entusiasmo com as conquistas que já se concretizaram na dignificação deste momento tão precioso.
P&F – De que forma aconteceu a sua aproximação com a “International MotherBaby Childbirth Iniciative” (IMBCI)?
RHJ – Fui convidado a participar, na condição de observador, dos encontros anuais do CIMS – Coalition for Improvement of Maternity Services – uma coalizão de mais de seis dezenas de entidades americanas de proteção ao parto e à amamentação. Esta entidade havia criado em julho de 1996 um protocolo chamado de “Iniciativa para um Nascimento Amigo da Mãe” (Mother-Friendly Childbirth Iniciative), composto por “10 Passos” a serem cumpridos pelas maternidades e/ou Casas de Parto, a exemplo do que acontece com os hospitais e clínicas que se propõe a ser “Amigas da Criança”. Baseado na idéia de que os “10 Passos” do CIMS poderiam ser estendidos para além das fronteiras americanas, o CIMS criou em 2005 um Comitê Internacional com participantes de várias nações, que representavam suas específicas perspectivas diante da necessidade de humanizar o nascimento em seus países e contextos. Eu representava a ReHuNa (Brasil) e a HumPar (Portugal) naquela ocasião. Com o tempo este comitê começou a ganhar vida própria e surgiu a necessidade de se tornar independente do CIMS, para que sua ação fosse autônoma e abrangente, estendendo, aprimorando e adaptando a idéia dos “10 passos” para o resto do mundo. A partir do desmembramento e da criação da IMBCO (International Motherbaby Childbirth Organization) eu fui convidado a representar o Brasil nesta organização, e me tornei um colaborador na elaboração do documento da IMBCI. Hoje em dia a representante para as Américas é Flávia Previtali, do Uruguay, e para a Europa é Lucie Ryntova, da Republica Tcheca. Em Portugal a parteira Mary Zwart representa a iniciativa.
P&F – Que instituições estão actualmente, na base do trabalho desenvolvido e a desenvolver pela IMBCI?
RHJ – A IMBCO tem um grupo consultor técnico composto por várias instituições. Tais instituições são instâncias de consulta e suporte. Elas não estão oficialmente oferecendo apoio para as determinações do CIMS, e servem como ajuda técnica, oferecendo subsídios para debates e busca de consensos. Não há a necessidade de receber o apoio irrestrito destas instituições neste momento, mas elas nos ofereceram aconselhamento e idéias durante a fase de elaboração da IMBCI. A IMBCI está entrando na sua fase “piloto”, que objetiva a realização de testes de campo para clínicas e maternidades que se qualificarem para a implementação de seu protocolo. A lista das organizações que se constituíram na base do IMBCI pode ser encontrada em: www.imbci.org/ShowPage.asp?id=186
P&F – Os 10 passos para o modelo de parto MotherBaby Initiative são resultado de um extenso trabalho de pesquisa e de concertação de ideias por parte de inúmeras instituições e profissionais ao redor do Mundo. O consenso atingido significa um poder maior de reivindicação destes conceitos e práticas?
RHJ – Sem dúvida esta é a idéia central que nos move. A experiência com os “10 Passos” criados pelo CIMS nos mostrou que um documento que fosse apoiado por um grande número de instituições poderia ser o catalisador de importantes transformações na área da assistência à mãe e ao bebé, além de oferecer suporte para as instituições e indivíduos que desejassem firmar sua ação num modelo de atenção baseado em evidências. Entretanto, os “10 Passos” foram criados pelas instituições americanas e adaptados segundo suas necessidades específicas. Este documento não poderia ser simplesmente “exportado” para outros contextos, porque isso apareceria como mais uma imposição da cultura americana sobre os outros povos. A idéia que naturalmente nos ocorreu foi criar um consenso internacional, ao mesmo tempo sucinto e abrangente, sobre pontos fundamentais, tendo como base no que já havia sido discutido durante a elaboração dos “10 Passos” do CIMS. E foi o que fizemos, através de uma gigantesca pesquisa com instituições afins no mundo inteiro, em vários continentes, com a aprovação maciça da maioria das nossas propostas pelas entidades pesquisadas. Tudo isso com o auxílio prestimoso do Center for Women’s Health Research, da Universidade da Carolina do Norte.
P&F – Da dezena de passos, quais lhe parecem ser os mais “facilmente aplicáveis” a nível global? E quais são aqueles onde existe mais caminho a percorrer?
RHJ – Acredito que o passo número 3 “Informar a mãe dos benefícios do suporte contínuo durante o trabalho de parto e parto, e afirmar o seu direito de receber este apoio de um acompanhante de sua livre escolha” já está sendo implantado em vários lugares do mundo ocidental. Hoje em dia os hospitais americanos já entendem este como um direito básico de toda grávida. No Brasil, no ano de 2005, durante o II Congresso Internacional de Humanização do Nascimento no Rio de Janeiro, foi assinada pelo ministro da saúde a “Lei do Acompanhante”, que garante a toda a parturiente o direito de ter uma companhia de sua escolha durante o parto. A presença crescente das doulas – acompanhantes de parto – no suporte às grávidas e o ressurgimento de uma nova “consciência feminina de parto” (em que o suporte emocional é encarado como fator preponderante) são notáveis conquistas dos últimos anos, fazendo com que o ancestral suporte social, psicológico, afetivo e espiritual do nascimento seja resgatado lentamente na cultura ocidental contemporânea. Acredito que o reconhecimento do “parto como evento social”, e a importância de oferecer suporte contínuo de ordem emocional às grávidas são os aspectos da IMBCI que serão mais rapidamente incorporados à cultura, tanto popular quando médica.
Por outro lado o passo número 9 “Prover uma continuidade de cuidado colaborativo com todos os provedores de cuidados, instituições e organizações” ainda é um ponto muito delicado. O nascimento é um momento muito marcante, pois é o evento humano em que mais vivamente se congregam vida, morte e sexualidade. Por esta razão, uma rede de poderes se estabelece sobre o corpo da mulher, numa disputa em que o que menos se houve é a voz da parturiente, abafada pela luta que se trava sobre seu ventre. A forma hegemônica contemporânea de assistência ao parto se expressa através da medicina tecnocrática, iatrocêntrica (centrada no médico), etiocêntrica (centrada na patologia) e hospitalocêntrica (centrada no hospital). Desta forma, os médicos obstetras dos países que se situam no círculo de influência dos Estados Unidos assumiram o monopólio quase completo da assistência ao parto, deixando as parteiras profissionais (enfermeiras obstetras e parteiras) com pouco – ou nenhum – espaço para atuar. Essa realidade é diferente na Europa, principalmente ao norte, onde se preservou o trabalho milenar oferecido pelas parteiras na assistência ao parto de baixo risco. Não por acaso, em tais lugares observamos os melhores índices mundias de morbi-morlalidade materna e neonatal, demonstrando que um modelo que prioriza a saúde em detrimento da doença, e que investe na prevenção do dano tanto ou mais do que na sua correção, tem claramente resultados mais positivos. Infelizmente, no momento atual, ainda vemos as corporações apartadas e pouco cooperativas, lutando por espaço e reconhecimento na atenção ao nascimento. Enquanto não redistribuirmos competências e não assumirmos uma postura mais sensata quanto ao atendimento do parto de baixo risco, ainda teremos sérios entraves na cooperação entre os vários setores de assistência. Obstetras, doulas, parteiras profissionais, parteiras tradicionais, médicos de família e outros profissionais de saúde são componentes essenciais da rede de suporte às gestantes, e do bom funcionamento desta engrenagem é que emergirá um modelo mais coerente e seguro para o nascimento.
P&F – Uma das ideias mais inovadoras é a de considerar a mãe e o bebé uma “unidade integral durante a gravidez, parto e primeira infância”. Isto significa assumir que as consequências da forma como se dá o nascimento se desenvolvem no tempo, para o bem ou para o mal?
Nosso desenvolvimento dinâmico como espécie precisou expulsar nossos fetos antes do desenvolvimento neurosensorial completo. Por esta imaturidade ao nascer somos mamíferos altamente altriciais, isto é, necessitamos do outro (alter em latim) de forma absoluta para a nossa sobrevivência. O recém nascido humano é completamente dependente dos cuidados parentais, mais do que qualquer outra espécie do planeta. Ao nascer somos “fetos extra-uterinos”, pois nosso desenvolvimento cerebral vai ocorrer principalmente fora da matriz uterina, no que se chama “exterogestação”. No momento de nascer temos uma profunda incompletude corporal e neurológica, o que nos arremessa num universo marcado pelas incertezas, pela insegurança e pelo medo. Há muito que pesquisadores estudam as adaptações psíquicas do recém nascido e já se formou um consenso de que os fatos e situações que ocorrem no período que cerca o nascimento são capazes de produzir repercussões a longo prazo e por toda a vida. O nascimento é, portanto, uma encruzilhada para os dois viajantes que embarcam nesta aventura: a mãe e seu bebé. Por sua potencialidade transformadora o parto pode jogar a mulher em um estado de depressão, tristeza e desencanto, caso não seja respeitada nos seus direitos e na sua dignidade. Ela pode sofrer as conseqüências danosas de não ter sido considerada durante as importantes decisões a respeito do nascimento de seu filho. Por outro lado, um nascimento em paz pode colocá-la na posição de estrela fulgurante de um processo de profundo empoderamento pessoal. O evento do parto pode significar para ela um “renascimento”, o momento no qual vencerá uma série de barreiras, dificuldades e desafios impostos a ela por muitos anos de menos valia. Pode ser o momento da grande “virada” em sua vida, como tantos de nós já tiveram a oportunidade de testemunhar. Seu bebê, por seu turno, pode ser marcado pela cicatriz dura e indelével do afastamento, do abandono e da solidão. A fragilidade de seu sistema neurológico imaturo pode intensificar e ampliar a sensação de desamparo que sucede um nascimento. É por esta razão que pesquisadores como Marshall e Klaus insistiram tanto na preservação da “hora dourada” – que é a primeira hora que se segue ao parto – por entenderem que ali, neste momento sensível, se estabelecerá o “imprint” emocional do recém nascido. Este imprint tanto pode ser uma marca negativa como pode ser um momento de amparo e conforto ao recém nascido, diante do difícil desafio de nascer. As escolhas nesta encruzilhada repousam claramente nas mãos dos profissionais responsáveis pelo nascimento. Podemos nos decidir pelo afastamento e pelo frio tecnicismo tecnocrático atual; por outro lado, podemos fazer a escolha pela proximidade, o carinho, o calor de um colo materno e a segurança de profissionais respeitosos e sensíveis acompanhando o evento. Este é o desafio para o milênio que mal se inicia: como queremos receber os pequenos que chegam até nós?
P&F – Existem trabalhos que estudem o impacto das práticas seguidas no parto no sucesso ou insucesso da amamentação?
A parteira americana Mary Kroeger foi uma das pioneiras do CIMS e posteriormente idealizadora do IMBCI. Infelizmente ela faleceu prematuramente e não pôde acompanhar a criação da iniciativa. Sua experiência como enfermeira obstetra – que trabalhou em vários países e culturas, tão diferentes quanto as realidades do Camboja e dos Estados Unidos – lhe ofereceu um visão abrangente e diversificada do intrincado e complexo sistema cultural que governa a assistência à saúde da mulher. Uma de mais notáveis observações nas suas viagens e atuações como enfermeira obstétrica foi a constatação de que o modo de parto afetava de forma decisiva o aleitamento materno. Um parto cirúrgico produzia efeitos no aleitamento materno, assim como um parto gentil e amoroso o afetava igualmente; o primeiro negativamente, e o segundo de forma positiva. Sua idéia era a de que parto e amamentação não são momentos separados ou distintos, mas que fazem parte do continuum da maternagem, e que o debate sobre a amamentação precisava incluir o que havia ocorrido imediatamente antes: a atenção ao parto. Antes de falecer Mary escreveu um livro maravilhoso (com a co-autoria de Linda Smith) chamado “Impact of Birthing Practices on Breastfeeding – Protecting the Mother and Baby Continuum” (Impacto das Práticas Obstétricas na Amamentação – Protegendo o Continuum Mãe – Bebê). Neste livro ela aborda cientificamente as repercussões das práticas utilizadas no parto relacionando-as com o sucesso na amamentação. O livro é recheado de estudos e referências sobre a indissociabilidade entre parto e amamentação, incentivando-nos a considerar ambos os eventos em conjunto, ao invés de mantê-los separados, como se um evento nada tivesse a ver com o outro. A pesquisa científica atual nos mostra que tudo que ocorrer com esta mãe na hora do parto terá repercussões na continuação do processo de maternagem, e a amamentação é o fenômeno mais importante que se segue, pois terá efeitos importantes na mãe e no bebê, tanto físicos quanto psicológicos. Em suma, “o sucesso da amamentação se inicia na assistência ao parto”.
P&F – A IMBCI faz uma grande aposta no trabalho conjunto de profissionais, instituições e organizações, construindo pontes entre os vários modos de actuação, disciplinas e modelos culturais. São objectivos muito ambiciosos. Concorda?
Certamente que é ambicioso. Quando divagávamos sobre a criação da IMBCI a imagem que nos vinha à mente era a “Declaração de Direitos Humanos”. Era esse o nosso paradigma, o nosso modelo. Nossa pretensão era criar uma base de dados internacional para produzir um documento que servisse de suporte e resguardo dos direitos fundamentais de mães e bebês para o nosso planeta. Desejávamos que mulheres da Namíbia, do Equador, do Vietnã, do Afeganistão ou da Holanda tivessem todas um direito essencial no que diz respeito à atenção do seu parto, nos cuidados com seu bebê e na proteção à amamentação. Queríamos que as evidências científicas fossem a estrutura firme e concreta que oferecesse consistência às nossas propostas. Nosso sonho era uma humanidade unida por práticas que incentivassem o carinho, o amor, o cuidado, o respeito e a ternura com o ato de parir e amamentar. Desejávamos um mundo que estivesse de mãos dadas e que falasse um único idioma: a linguagem do amor aos bebés e do respeito à mulher. Para isso, a democracia deveria ser nossa ferramenta, e por esta razão investimos na consulta internacional às instituições envolvidas com o nascimento humano e seus múltiplos desdobramentos. Sabíamos desde o início que esta tarefa seria gigantesca demais para ser completada rapidamente, e reconhecíamos no debate e no atrito de posições contrárias a melhor maneira para produzir consensos e soluções, mesmo que as divergências atrapalhassem o nosso afã de seguir em frente. Hoje temos plena confiança na capacidade renovadora do ser humano e, por sermos humanistas, nutrimos uma infinita fé na fraternidade, síntese definidora do que conhecemos por humanidade. A elaboração deste documento, e sua apresentação oficial em um grande evento de caráter internacional no futuro, serão marcos de uma nova era que confirmará as palavras do pensador austríaco Wilhem Reich:
“A Civilização começará no dia em que o bem estar dos recém-nascidos prevalecer sobre qualquer outra consideração”.
Que assim seja!
* Ricardo Herbert Jones, MD
HumPar – Associação Portuguesa para a Humanização do Parto
ReHuNa – Rede pela Humanização do parto e Nascimento – Brasil
IMBCO – International MotherBaby Childbirth Organization