Licença-maternidade de seis meses
está perto de se tornar lei
Deputados pretendem votar no Dia Internacional da Mulher uma proposta que tornaria obrigatória a ampliação da licença-maternidade para seis meses
Itamar Melo
A bancada feminina na Câmara dos Deputados trabalha para transformar o próximo Dia da Mulher em ocasião para uma nova conquista. O plano é levar à votação, no dia 8 de março, uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que torna obrigatória no país a licença-maternidade de seis meses.
A discussão controversa ocorre menos de um mês depois de iniciado o período de adesão para empresas interessadas em ampliar voluntariamente a licença de suas funcionárias. Um primeiro passo para tornar obrigatório o que recém se tornou facultativo foi dado na semana passada, quando uma comissão especial da Câmara aprovou por unanimidade parecer da deputada Rita Camata (PSDB-ES) à PEC que amplia a licença para as mães de 120 para 180 dias.
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Pelo substitutivo apresentado pela deputada capixaba, todas as mulheres que recolhem o INSS, incluindo as mães adotantes, seriam contempladas com os dois meses a mais de licença. Se obtiver os votos necessários no plenário da Câmara e no Senado, a proposta se transformará em um direito previsto na Constituição.
Hoje, o benefício está restrito a uma pequena parcela das mães, que inclui servidoras públicas e de empresas que participam do programa Empresa Cidadã, que é facultativo e atinge apenas companhias de grande porte, excluindo cerca de 70% da força de trabalho feminina no mercado formal.
Conforme cálculo da própria Rita Camata, a extensão da licença apresentada na PEC representaria um custo adicional à Previdência, que arcaria com os pagamentos, de R$ 1,69 bilhão em 2010, R$ 1,84 bilhão em 2011 e R$ 2,03 bilhões em 2012.
– Representa menos de 1% de todos os benefícios pagos pela Previdência. Nossa leitura é que se trata de um investimento. A criança ficará mais saudável e vão diminuir os custos do SUS – afirma a deputada.
Atualmente, a chance de uma mulher na iniciativa privada tirar seis meses de licença depende da adesão do empregador ao Empresa Cidadã. Fruto de uma lei aprovada desde dezembro de 2008, o programa foi regulamentado apenas em janeiro. Ele teve o período de adesões para as empresas aberto no último dia 25 pela Receita Federal – que ainda não tem um balanço das inscrições, mas divulgou que o custo previsto para 2010 é de R$ 414 milhões.
A experiência de Fernanda
A auxiliar de enfermagem Fernanda Rocha, 30 anos, engravidou na hora certa. Ela estava a poucas semanas de dar à luz quando o Grupo Hospitalar Conceição, onde trabalha, adotou os seis meses de licença-maternidade. Como ela, outras 323 funcionárias do grupo já se beneficiaram da licença. O Conceição foi a primeira empresa pública a adotar os seis meses, em janeiro de 2008. Para Fernanda, que teve as gêmeas Eduarda e Daniele, hoje com um ano e nove meses, fez uma grande diferença.
– Se para quem tem um filho a licença de seis meses já é importante, imagina para mim, que tive duas. Com quatro meses, a criança ainda depende muito da mãe, principalmente por causa do aleitamento. Com seis meses, já está um pouco menos dependente – diz a auxiliar de enfermagem, que conseguiu amamentar a dupla até os cinco meses de idade.
No caso de Fernanda, que trabalha no Hospital Cristo Redentor, se não fosse a extensão do benefício, as meninas teriam ido para uma escola infantil já aos quatro meses de idade – e ela voltaria ao trabalho preocupada e insegura. Os dois meses a mais significaram um retorno tranquilo.
– Um problema é que antes dos seis meses o bebê ainda chora muito, às vezes não dorme. Se a mãe não está de licença, fica esgotada, sem condições de trabalhar, porque são muitas noites sem dormir – diz.
No Conceição, a ampliação da licença é celebrada até por quem poderia ter dores de cabeça com ela. José Pedro da Luz, gerente de recursos humanos do grupo, é um entusiasta da ideia.
– Os afastamentos e atestados posteriores às licenças caíram. Como as mães amamentam por mais tempo, as crianças apresentam menos problemas depois – observa.
Como funciona atualmente
Fruto de uma proposta encaminhada pela Sociedade Brasileira de Pediatria, a lei do Empresa Cidadã foi parcialmente esvaziada por um veto presidencial que deixou de fora pequenas e médias empresas – e a maioria das mulheres, por consequência.
No programa, que é facultativo, a empresa que adere paga os dois meses de salário adicionais, mas depois recebe o dinheiro de volta, mediante abatimento no Imposto de Renda. A licença não é compulsória. A mãe pode decidir ficar apenas com os quatro meses. A emenda constitucional também amplia a estabilidade da gestante de cinco para sete meses – a mãe não poderia ser demitida sem justa causa nos sete meses seguintes ao parto.
– O veto presidencial deixou capenga o benefício, que já era facultativo. Por isso existe a necessidade da PEC – argumenta Rita Camata.
No caso de uma PEC, a promulgação se dá pelo Congresso, sem necessidade de sanção presidencial – o que significa que ela não pode ser vetada. Para que os seis meses de licença sejam inscritos na Constituição, no entanto, é preciso que a proposta seja aprovada em dois turnos na Câmara e no Senado.
Aprovadas pelo Congresso no ano passado, as regras vigentes permitem às empresas deduzir do IR os gastos com os dois meses extras de licença. Para isso, elas têm de aderir ao programa. A extensão do benefício que está em tramitação é diferente. Além de tornar a licença de seis meses obrigatória, diz que a Previdência Social deve arcar com as despesas. Segundo Rita Camata (PSDB-ES), os gastos estimados com salário-maternidade em 2008 foram de R$ 2,7 bilhões.
E os pais?
Projetos em andamento no Congresso podem tornar também a convivência do pai com o recém-nascido mais prolongada. A própria Rita Camata, que defende 30 dias de licença para todos os pais, reagiu ao veto presidencial ao Empresa Cidadã com um projeto que dá um mês aos pais, nos casos em que a mãe trabalha em uma empresa que não aderiu ao programa e o companheiro, sim. A ideia é que ele aproveite o beneficio quando a licença-maternidade acaba. No Senado, um projeto que aumenta a licença-paternidade de sete para 15 dias, beneficiando também quem adota, já obteve aprovação na comissão de assuntos sociais. Tramita agora na Câmara. A autoria é da senadora Patrícia Saboya (PDT-CE).
Entrevista: “Esses seis meses são insubstituíveis”
Dioclécio Campos Júnior, presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria
A legislação atual nasceu de uma proposta idealizada e redigida pelo presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Dioclécio Campos Júnior. Um veto presidencial acabou deixando de fora pequenos e médios empregadores, para decepção da entidade. Campos Júnior defende as vantagens de estender o benefício:
Zero Hora – O que a aprovação da PEC da licença-maternidade representa?
Dioclécio Campos Júnior – A PEC representa um avanço. É uma consolidação da bandeira da SBP, no sentido de garantir a todas as crianças os cuidados adequados a que têm direito. Mas há questões que precisam ser aprofundadas, como o direito das mulheres de avaliar a conveniência dos dois meses a mais. A PEC torna os seis meses obrigatórios. Na proposta da SBP, que deu origem ao Empresa Cidadã, isso é facultativo, para a mãe ter o direito de decidir. Estamos lutando para que nosso projeto original, que foi alvo de veto presidencial, seja retomado, com a inclusão também de pequenas e médias empresas.
ZH – Quais são os benefícios trazidos pela licença de seis meses?
Campos Júnior – Um erro muito comum é pensar que a licença-maternidade de seis meses é para permitir que a mãe amamente durante seis meses. Isso é só uma consequência. O principal objetivo é propiciar as condições necessárias e ideais para o estabelecimento do vínculo afetivo entre a mãe e a criança. Esses seis meses são insubstituíveis.
ZH – Mas o aleitamento materno também é importante?
Campos Júnior –
Um benefício do aleitamento está relacionado ao desenvolvimento do cérebro. Além disso, o leite tem nutrientes que regulam a imunidade e conferem resistência a várias doenças.
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