Pais desconstroem masculinidade tóxica
Exemplos de paternidade ativa no dia-a-dia mostram que participar da vida do filho vai além de pagar as contas
Natália Moraes/Campo Grande News
Se para as mães de primeira viagem a maternidade assusta, para os pais, o assunto ainda é um tabu. Mas alguns exemplos mostram que é possível exercer a paternidade no cotidiano e de forma saudável.
Com a pequena Aya de um ano no colo, o estudante Marcelo Lima, de 24 anos, aparece em uma foto feita durante viagem para Curitiba. Quem o conhece sabe que a cena é comum, não são necessárias publicações em redes sociais para comprovar a participação na vida da filha. Mas, para ele se sentir seguro desta forma, foi preciso um tempo.
A paternidade para Marcelo veio com um susto, aos poucos substituído pela ansiedade. Para se entender como pai, ele precisou construir a experiência ao lado da mãe da criança, a professora Heidy Maiyuni. Juntos, os dois compartilharam as expectativas do que considerariam ser a melhor educação para a filha, o que incluiu uma alimentação saudável, parto humanizado e referências culturais das duas heranças da pequena, asiática e africana.
Marcelo conta que a paternidade permitiu criar uma rede de contatos, para pedir ajuda, trocar informações e ver como outros homens a exercem. Os caminhos para se tornar um pai presente refletem uma educação que recebeu desde sempre. “Apesar da minha família não ser perfeita, ela foi estruturada de certa forma, todo mundo junto, então a figura paterna sempre foi muito presente”, explica.
Ele aprendeu assim que a paternidade, assim como a maternidade, é uma construção. Não se nasce pai, é preciso a prática, formada por momentos frustrantes e encantadores. “Tanto a paternidade, quanto a maternidade, são sentimentos muito viscerais, elas não podem ser banalizadas, mas não podem ser romantizadas, porque é um misto de frustração, de alegria e tristeza, de você abrir mão de certas coisas, ir para um futuro que você não imagina”. Mas, na opinião do pai, é experiência que traz uma força única. “Tenho objetivos, antes queria ser antropólogo, agora preciso ser, por ela”.
Os conceitos do que é ser pai ou homem vem mudando com o tempo.
A paternidade presente, com o estímulo a um vínculo carinhoso, divisão das tarefas de cuidados com o filho e com a casa e participação em todas as fases de desenvolvimento, por exemplo, trazem uma visão saudável e desassociada do conceito de masculinidade tóxica – relacionada à violência, agressão, domínio.
Pai de Naruê, de um ano e nove meses, e Caê, de seis meses, o assessor jurídico Tayran Valiente, de 28 anos, conta que ao se descobrir pai, desde o início escolheu estar presente. Ele define o momento como a “realização de um sonho”. “O ritmo de vida muda muito, mas isso acontece quando a gente opta por estar presente na criação dos filhos, estou mais envolvido com as coisas da casa, desde arrumação, até dedicar o meu tempo livre para coisas mais importantes que vão trazer algum fruto para os filhos”.
A criação com afeto envolve desde a conversa sobre paternidade com um grupo de amigos no Whatsapp, ao acompanhamento de sites, como o canal “Paizinho Vírgula”, até curso sobre educação parental com uma psicóloga. A educação é compartilhada com a dona de casa Marina Duarte, e os dois optaram por criar os pequenos com disciplina positiva e comunicação não violenta.
“Minha companheira me ensina muito a respeito do feminismo, mostra os meus privilégios masculinos, além disso a paternidade tem me feito me tornar uma pessoa melhor, me escutar mais, isso só acontece porque optei por viver isso integralmente”, finaliza.
Com o sonho de ser pai desde cedo, ao viver essa condição o professor André Luís Silva Lima, de 24 anos, não achou nada difícil. Ele é hoje pai de dois, do enteado Eduardo, de 5 anos, e de André Lucca, de apenas 12 dias.
André define a paternidade como um “aprendizado diário”. O desafio agora é segurar o bebê no colo, colocar para dormir, trocar fralda e outras atividades comuns neste início da vida. Para compensar a falta de prática, ele aumentou a participação nos afazeres domésticos, para não sobrecarregar a companheira, a também professora Emanoelle Ifran.
Apesar de não ter uma rede de contatos ainda ampla, ele sempre busca obter informações com as mulheres da família. Para se aproximar do enteado, o segredo foi criar vínculo. De “tio” o menino passou a chama-lo de “pai” e entre as diversões com o pequeno, estão os jogos de futebol e desenhos com personagens negros e sem estímulo a violência, nada associado à masculinidade tóxica. “Busque ser o mais presente possível, é uma grande responsabilidade, é preciso correr muito lá fora para não deixar faltar em casa”, orienta.
Imagens:
Marcelo com Aya, nome que significa “resistência” na simbologia Adinkra, da cultura africana; e em japonês “colorido”, representando a cultura asiática.
Pai de Naruê, de um ano e nove meses, e Caê, de seis meses.
André Luis também é pai do enteado, Eduardo, de 5 anos.
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