Regulação e
publicidade
de alimentos
Vidal Serrano Júnior e Mariana de Araujo Ferraz
Pela importância que tem, a publicidade de alimentos merece legislação e normas fortes, acompanhadas de medidas eficazes de educação
Recentemente, o IBGE evidenciou a mudança no hábito alimentar do brasileiro, que vem substituindo o consumo de alimentos “in natura” por ultraprocessados, densamente calóricos e com baixa concentração de nutrientes.
Basta ligar a televisão para verificar esse tipo de alimento sendo anunciado diretamente para a criança com um forte apelo a elementos infantis -como o uso de personagens em universos lúdicos.
Em contrapartida, estudos como o do Ministério da Saúde apontam o crescimento nos índices de obesidade infantojuvenil no Brasil e das doenças dela decorrentes ,como hipertensão e diabetes.
Preocupada com o número de casos de obesidade, a Organização Mundial da Saúde propõe maior fiscalização dos governos à publicidade alimentícia. Até 2015, mais de 1,5 bilhão de pessoas serão obesas no mundo e, nesse sentido, a organização recomendou que os países trabalhassem para restringir e fiscalizar a publicidade de alimentos não saudáveis às crianças.
Diante desse fato, parte da indústria alimentícia e do setor publicitário posiciona-se contrariamente à regulação da publicidade de alimentos, associando-a à ideia de “cerceamento de liberdades”.
Para uma sociedade como a brasileira, que passou por décadas de regime ditatorial repressivo, falar-se nos dias de hoje em tolhimento da liberdade de expressão é de causar arrepios. No entanto, ao cidadão cabe o questionamento do real significado da regulação e de sua função no contexto de um Estado democrático de Direito.
Conforme definido pela doutrina jurídica brasileira, quando se fala de um “direito à publicidade”, cumpre esclarecer que o mesmo não está inserido no âmbito da livre manifestação do pensamento, mas no da garantia da livre iniciativa.
Esta, por sua vez, não deve ser vista como ilimitada, podendo estar legitimamente sujeita a regramentos que visem o respeito a outros direitos: a existência do Código de Defesa do Consumidor é o melhor exemplo disso. Nesse sentido, quando a mensagem publicitária entra em conflito com direitos fundamentais garantidos na Constituição Federal, tais quais o direito à saúde ou os direitos do consumidor, podemos visualizar com clareza a necessidade de limites à comunicação mercadológica.
Pela importância que apresenta, a publicidade de alimentos merece legislação e normas fortes, acompanhadas de medidas eficazes de educação populacional.
A regulação não deve ser temida quando feita sob critérios de transparência e participação da população, mas, sim, comemorada como conquista dos brasileiros e da ordem democrática que escolhemos.
VIDAL SERRANO NUNES JÚNIOR, promotor de Justiça, professor livre-docente em direito constitucional na PUC-SP, é presidente do conselho diretor do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, entidade que integra a Frente pela Regulação da Publicidade de Alimentos). É autor do “Código de Defesa do Consumidor Interpretado” (Verbatim), entre outros.
MARIANA DE ARAUJO FERRAZ, mestranda em direitos humanos pela Faculdade de Direito da USP, é advogada do Idec
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