Os corpos são das mulheres:
por uma amamentação feminista
Laura Lino
Mãe, Feminista, Enfermeira, Consultora de Amamentação
Este portal se empenha em promover discussões e ações para que TODAS as mulheres tenham o direito de amamentar.
A amamentação é um direito da mulher e do bebê. Mas, a decisão de amamentar ou não é, exclusivamente da mulher. Apenas ela pode decidir sobre o seu corpo. Entretanto, nem sempre esse direito de escolha está garantido.
A ideia de que a amamentação é fundamental para o bebê desde a primeira hora de vida e que tem efeitos no desenvolvimento humano até sua fase adulta, é bastante conhecida. Ela traz benefícios à saúde da mulher e tem reflexos positivos tanto para a economia quanto para o meio ambiente. Mas infelizmente, as taxas de aleitamento materno ainda são baixas.
Se por um lado há pressão da sociedade para que a mulher amamente, visando os efeitos positivos na saúde do bebê, por outro lado as mulheres sentem-se inseguras nesse processo, principalmente, em relação a sua capacidade de amamentar. Isto é consequência de uma sociedade pautada em relações desiguais de gênero, raça e classe social. Uma sociedade patriarcal julga a mulher que amamenta, questionando por quanto tempo ela vai amamentar, se o leite materno está sendo suficiente para o desenvolvimento do bebê, etc.. Mas, se ela não amamenta é julgada também porque “não foi capaz de alimentar seu próprio filho”.
A legislação brasileira garante a licença maternidade por 4 meses e em algumas situações por até 6 meses. Mas, pesquisas apontam que a volta ao trabalho é um dos fatores mais alegados para o desmame precoce (FIGUEREDO, 2009 e UCHIMURA et. al 2001). É preciso considerar que nem toda mulher possui trabalho formal e, mesmo que tenha, não possui muitas garantias para retornar ao trabalho e continuar amamentando seu filho.
Na modernidade a amamentação, passa pelo olhar de vários profissionais da saúde, são médicas, enfermeiras, fisioterapeutas, fonoaudiólogas, nutricionistas, psicólogas, etc. que estão por traz dos processos de amamentação. Atrelado a isso, é cada vez mais frequente os processos de medicalização do corpo da mulher, como por exemplo, a introdução de medicamentos para estimular a produção de leite ou então, a utilização de pomadas ou a Laserterapia para ajudar na cicatrização de lesões. Essas intervenções biomédicas sobre o corpo feminino coloca a amamentação numa categoria patológica e diminui sua autonomia, autoestima e confiança. Mesmo que essas intervenções sejam realmente necessárias é importante que sejam ajustadas às necessidades e desejos de cada mulher.
Diante disso, é urgente o reconhecimento da mulher como protagonista desse ato, que se por um lado é um direito universal a vida, a saúde e a alimentação do bebê por outro lado é um trabalho doméstico não remunerado (FEDERICI, 2019). A mulher não pode ser vista como uma máquina de leite que tem como função a produção de bebês e adultos mais saudáveis e inteligentes como se estas vidas fossem mercadorias.
Para que a amamentação seja uma experiência respeitosa, satisfatória e a mulher possa usufruir desse momento tão importante e desafiador, é fundamental que ela esteja amparada por políticas públicas que assegurem esse direito. Mas também é importante que sua decisão de amamentar ou não seja preservada. Para isso é essencial que ela conheça seu corpo, se sinta acolhida pela família, respeitada pela sociedade, bem assistida pelos profissionais da saúde e tenha suporte total do Estado.
É, igualmente, urgente que o campo dos estudos em aleitamento materno seja impactado por uma virada feminista, que não se resuma apenas à presença de mais mulheres na produção do conhecimento mas, que, ao levar em conta as desigualdade de gênero, possa contestar, desconstruir e, sobretudo se posicionar criticamente (HARAWAY, 2009). Isto se faz extremamente necessário, uma vez que, os paradigmas biomédicos, muitas vezes, omitem dados importantes quando tratam os corpos das mulheres como se fossem constantes biológicas universais.
Neste Portal, concebemos, que a amamentação é um ato de resistência, pois é conhecer e confiar no próprio corpo, na potencialidade de ser mulher e resistir mesmo com tantas dificuldades para seguir amamentando. Temos o compromisso de deixar este espaço aberto para promover e contribuir para essas reflexões.
Referências
FEDERICI, Silvia. O ponto Zero da Revolução: trabalho doméstico, reprodução e luta feminista. Tradução de ColetivoSycorax – São Paulo: Elefante, 2019.
FIGUEIREDO SF. Avaliação da iniciativa Hospital Amigo da Criança na prática do Aleitamento Materno exclusivo nos primeiros seis meses de vida em uma maternidade pública da cidade de São Paulo. Dissertação [Mestrado em Enfermagem]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo; 2009
HARAWAY, Donna. “Saberes localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial”. Cadernos Pagu, Campinas, n. 5, p. 7-41, 2009. Disponível em: Disponível em: http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?down=51046 . Acesso em 10/07/2020.
UCHIMURA NS, GOMES AC, UCHIMURA TT, YAMAMOTO AE, MIYAZATO P, ROCHA SF. Estudo dos fatores de risco para desmame precoce. Acta Sci. 2001;23(3):713-18.
Essa questão não é nova no aleitamento.com – vejam:
Mamãe Desobediente: um olhar Feminista sobre … – Aleitamento.com
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8 Mar 2019 … Um olhar feminista sobre a maternidade.” Nele, a autora também analisa a relação “mal resolvida” do feminismo com a maternidade.
8 de março – AMAMENTAÇÃO & FEMINISMO … – Aleitamento.com
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7 Mar 2017 … 8 de março – AMAMENTAÇÃO & FEMINISMO: falsa contradição. AMAMENTAR é um ato FEMINISTA.
Amamentação: FEMINISMO, DIREITOS e GÊNERO – Aleitamento.com
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30 Mai 2011 … Amamentação é um direito humano básico e a proteção ao direito de amamentar é uma posição compartilhada pelo movimento de mulheres…
PATERNIDADE – ponte entre o FEMINISMO e as … – Aleitamento.com
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21 Ago 2015 … PATERNIDADE – ponte entre o FEMINISMO e as MASCULINIDADES. Por: Prof. Marcus Renato de Carvalho, UFRJ.
EcoFeminismo: Amamentação para um Planeta … – Aleitamento.com
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11 Jul 2020 … Muito oportuno esse debate unindo Feminismo e Ecologia e … se trata o Ecofeminismo, uma fusão entre as causas feministas e ecológicas.
Lugar de fala: “Amamentação não é de Graça!” – Aleitamento.com
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24 Set 2019 … Feminismo Com Classe + MMA – Militância Materna Ativa*. Antes que a tontura das endorfinas e drogas desapareça, uma consultora de …