Amamentação além do peito
Boa parte do sucesso do aleitamento está ligada à cabeça (à psique, ao estado emocional…)
Entenda os aspectos psicológicos que influenciam na amamentação e no desmame
Renata Losso, especial para o iG São Paulo | 04/09/2011
Foto: Getty Images
Amamentação: fatores psicológicos são fundamentais
Entre tantos preparativos para a chegada do bebê, para a psicóloga Solange Martins Ferreira, do Hospital Santa Catarina, muitas vezes o capítulo da amamentação acaba sendo o último a ser desvendado pelas mães. Mas a amamentação precisa ser compreendida além das orientações fisiológicas para acontecer da melhor forma.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda a amamentação exclusiva até os seis meses de vida do bebê – ou seja, até os seis meses, ele deve se alimentar só do leite materno. Mas, se vista apenas como uma meta de saúde, a amamentação pode deixar de ter todos os benefícios que pode proporcionar. O ato não é só uma maneira de nutrir o bebê, mas também oferece uma chance de construir uma ponte emocional. De acordo com Solange, a maneira como o seio é oferecido faz toda diferença: “Você pode estar amamentando a criança enquanto fala ao celular, mexe a panela, trabalha no computador. Mas desta forma você estaria sendo uma mamadeira humana. Não é a mesma coisa que amamentar”.
Quando a mãe escolhe a amamentação, é preciso considerá-la uma prática maternal que, além de nutrir, serve também para estimular a criança emocionalmente. De acordo com a psicóloga Cynthia Boscovich, também autora do site “Cuidado Materno”, o que mais pode prejudicar o êxito da amamentação é a mãe não estar completamente envolvida com o filho na hora de dar o leite.
Se a mãe estiver ansiosa ou com medo, a respiração dela pode ficar mais ofegante e o bebê, mais irritado. Segundo Solange, a amamentação passa a ser truncada e até dolorida. A mãe vai ficando impaciente, o bebê ainda mais irritado, e o momento vira uma bola de neve rumo ao fracasso. “Quando a mãe está se sentindo pressionada, isso acontece com facilidade”, diz Solange.
Para Cynthia, há uma cobrança social para as mães amamentarem infalivelmente. Mas cada mãe tem uma história de vida, capaz de facilitar ou dificultar a amamentação do próprio filho. Não é preciso se sentir culpada se algo sair errado. “Se o aleitamento se torna mecânico, é péssimo para o bebê. Mas algumas vezes acontece de dispersar. O importante é isso não se tornar um padrão”, diz.
O ambiente e a companhia também fazem toda a diferença. Em primeiro lugar, é preciso que a mulher encontre um encaixe para o aleitamento, uma posição ideal. A família deve saber diferenciar cobrança de incentivo, especialmente o marido. “A questão da amamentação deixou de ser assunto de mulher. Hoje é assunto de casal”, afirma Solange.
Por isso, todos devem ser compreensivos e pacientes neste processo. Se a mamãe de primeira viagem estiver nervosa enquanto estiver tentando dar de mamar, é importante começar de novo e ter tranquilidade. O parceiro pode colaborar dando atenção ao bebê enquanto a mulher se acalma, por exemplo.
Hormônios e satisfação
O consultor em amamentação Marcus Renato de Carvalho, também professor do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), explica que, se a mãe não estiver se sentindo confortável e tranquila, a ocitocina não será liberada. E é exatamente este hormônio que colabora para o fluxo do leite.
Segundo o especialista, no entanto, o que mais pode dificultar ou facilitar a amamentação é o desejo da mulher de amamentar. “É psicossomático. Tanto é que mesmo uma mulher que não ficou grávida e não deu à luz é capaz de amamentar. Então, a amamentação é fruto de um desejo, de uma vontade”, diz. É preciso pensar na amamentação como uma satisfação.
Esta vontade, segundo Marcus Renato, pode até ajudar a vencer a depressão pós-parto. “Assim como uma mulher pode sentir dificuldade em amamentar quando entra em depressão pós-parto, outras se valem da amamentação para sair da depressão”, diz ele.
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A hora do desmame
Tão importante quanto o processo de construção de laços é o caminho inverso, representado pelo desmame. Por simbolizar o fim de uma fase da relação entre mãe e bebê, muitas vezes é difícil encará-lo. Alguns bebês deixam de mamar naturalmente, quando, a partir dos seis meses, novos alimentos passam a ser introduzidos na alimentação. Mas muitas vezes a iniciativa tem que partir da mãe.
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A combinação da criança que não quer desmamar – porque tem carinho, colo e aconchego da mãe neste momento – com a mãe que quer ser insubstituível – e, por isso, precisa amamentar – é complicada. “O mais saudável é a mãe orientar o desmame e fazê-lo de forma gradual”, diz Cynthia. O processo é gradual tanto para o bebê, quanto para a mãe.
A vida é uma série de desmames e é natural que as coisas boas cheguem ao fim. É importante, portanto, que elas sejam aproveitadas – e abandonadas no tempo certo. A amamentação é um destes casos. “A mãe precisa continuar integrada com a própria vida e se cuidar também, para o desmame não ser mais complicado. Enquanto isso, o bebê vai caminhando para a independência naturalmente”, finaliza.
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