As curvas de crescimento atuais estão superestimadas.
O que isso altera a vida do seu filho?
Deborah Kanarek
Você é daquelas mães que não dormem se o seu bebê está um pouquinho abaixo do peso considerado normal para a idade? Então relaxe, pois a Organização Mundial da Saúde (OMS) acaba de admitir que a tabela de crescimento que ela própria criou está superestimada. As referências indicadas pelas curvas de crescimento mostram que há um sobrepeso em torno de 10% a 20% para crianças entre 2 e 3 anos de idade – mas foi detectado que há outras diferenças na faixa de zero a 5 anos. O que isso quer dizer? A atual tabela estipula, por exemplo, que uma criança de 1 ano deve pesar entre 10,2 e 12,2 quilos. Na verdade, porém, descobriu-se que o padrão mais comum de oscilação é entre 9,53 e 11,79 quilos. E por que isso aconteceu?
As curvas de crescimento usadas hoje foram feitas em 1977 usando-se bebês alimentados com leite artificial.
“Depois que as curvas foram criadas descobriu-se que a criança amamentada só no peito ganha menos peso e altura, a partir do terceiro mês do que a que toma leite artificial. Essa diferença preocupa os pais, que não se vêem espelhados na tabela. Hoje se sabe dos benefícios do leite materno, não vale mais aquela história de que o que cresce mais rápido é melhor”, diz Elza Giugliani, professora de pediatria da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e presidente do Departamento Científico da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), que colaborou na pesquisa no Brasil. Para corrigir o erro, e evitar que os bebês continuem a ser superalimentados desde cedo – contribuindo para aumentar a epidemia de obesidade infantil – , a OMS divulgará até outubro os novos parâmetros.
OMS divulgará a tabela com outros padrões até outubro
Erro de conta
As referências estão sendo criadas com base na análise de crescimento de 8,4 mil crianças amamentadas exclusivamente no peito pelo menos até o quarto mês de vida, em seis países: Brasil, Estados Unidos, Noruega, Gana, Omã e Índia. Para a nutricionista Cora Luiza Araújo, da Universidade Federal de Pelotas, que também participou da pesquisa, a nova curva vai tranqüilizar as mães. “Muitos bebês saudáveis foram desmamados inutilmente porque estavam com peso abaixo da tabela”, afirma. E avisa: “Bebês alimentados artificialmente poderão cruzar a fronteira do sobrepeso com mais facilidade. Outros pais ficarão em alerta e isso deverá incentivar a amamentação”, acredita.
Há várias razões para que o bebê que mama no peito ganhe peso mais devagar. No seio, o próprio bebê regula a quantidade de leite. Na mamadeira, os adultos costumam insistir para que ele mame um pouco mais. “Mães ansiosas podem oferecer a mamadeira com mais freqüência do que a necessária acreditando que o choro do filho seja sempre fome”, completa a pediatra especializada em Nutrição Humana da Organização Pan-Americana de Saúde (que representa a OMS no Brasil), Zuleica Portela Albuquerque. Além disso, é mais fácil errar o preparo da mamadeira: exagerar na quantidade de leite em pó ou colocar açúcar – não, não é preciso!
As novas referências estão sendo feitas com bebês amamentados exclusivamente no seio materno
Mais realista
O pediatra Jayme Murahovschi, que em 1987 foi premiado por ter criado a primeira tabela de crescimento para bebês amamentados exclusivamente no peito, acha positiva a iniciativa da OMS, com ressalvas. “Como qualquer parâmetro, ela não pode ser seguida cegamente. O lado bom é que isso fará com que todos fiquem mais atentos à alimentação dos bebês desde cedo “, diz. A curva é importante, sim, mas o pediatra também precisa acompanhar o que o bebê come por meio de um diário alimentar e observar se ele está se desenvolvendo bem. Além de incentivar o aleitamento materno – ou desestimular a obesidade infantil -, as novas tabelas serão uma referência mais realista na vida das mães. Quando for à próxima consulta com seu filho no pediatra, pelo menos você já sabe que os padrões estão mudando. Uma preocupação a menos para algumas – ou a mais para outras. Fique atenta.
Foto Fernando Martinho