Pediatra diz que alimento para bebê infringe normas
Os fabricantes de leite induzem as mães a trocar a amamentação dos lactentes por seus produtos, contrariando as normas da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do governo. Um levantamento em supermercados e drogarias de Brasília constatou que as embalagens recomendam sua adoção “desde o nascimento”. “Essa prática infringe a Resolução n° 31, do Conselho Nacional de Saúde, de outubro de 1992, que trata da comercialização de alimentos e produtos para lactentes”, afirma o pediatra Marcus Renato de Carvalho.
Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, com pós-graduação em Manejo Clínico da Lactação pelo centro de pesquisa Well Start International, da Califórnia, Carvalho foi um dos autores da primeira versão da norma, em 1988. “A expressão desde o nascimento é uma forma de induzir o consumo, pois todas as mulheres têm condições de amamentar”, diz.
Segundo a presidente do Conselho Nacional da Mulher, Solange Pentes Jurema, produtos destinados a mães que não conseguem amamentar são permitidos. “Mas em hipótese alguma os alimentos substituem o leite materno”, diz.
A norma exige que rótulos de alimentos complementares para lactentes informem, com destaque, que o aleitamento materno evita infecções e alergia, além de fortalecer o vínculo entre mãe e filho. Foram pesquisadas 15 marcas de leites complementares. Todas exibindo as frases em letras minúsculas nas partes laterais da embalagem.
Líder mundial de mercado, a Nestlé vende assim Nestogeno Fórmula Infantil com Ferro para Lactentes desde o Nascimento (454 g); Nestogeno Plus Fórmula Infantil Acidificada, com Ferro, para Lactentes desde o Nascimento (454 g) e Alfaré Alimento com Ferro para Lactentes e Crianças (400 g).
No leite Pregestimil (450 g), da Mead Johnson, está impresso que é “nutricionalmente completo para lactentes e crianças”. Só na parte inferior, a embalagem recomenda orientação médica. No Bebelac 1 Fórmula Infantil Láctea Até o 5° Mês (400 g), da Support, está escrito que “muitos bebês precisam suprir sua saciedade”. “Essa frase não é adequada. O aleitamento deve ser exclusivo até os seis meses. Só o pediatra para avaliar se o leite artificial deve ser utilizado”, diz o presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria, Lincoln Freire.
Jornal do Brasil – 4 de setembro de 2000