3 em cada 5 bebês não são amamentados ao nascer
Relatório conjunto OMS & Unicef que acaba de ser lançado afirma que 78 milhões de bebês a cada ano perdem essa oportunidade
31/7/2018 Observador, Portugal
O COLOSTRO – primeiro leite da mãe é rico em nutrientes e anticorpos e essencial para aumentar a probabilidade de sobrevivência dos bebês, mas há muitos que não têm acesso a ele na primeira hora de vida.
O leite materno é o alimento mais natural para os bebés e iniciar a amamentação até uma hora depois do nascimento aumenta a sua probabilidade de sobrevivência. No entanto, três em cada cinco crianças não são amamentadas na primeira hora de vida. Isto segundo dados dos países de rendimento médio e baixo, onde o acesso aos cuidados de saúde também é mais difícil, comprometendo a saúde dos bebés logo à partida. Faltam os dados dos países desenvolvidos, onde a recolha não está sistematizada de forma a ser comparada com o resto dos países.
Estima-se que, em 2017, 78 milhões de bebês não iniciaram a amamentação na primeira hora de vida, conforme um Relatório conjunto da Organização Mundial de Saúde (OMS) e UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância).
A amamentação na primeira hora de vida e o contato pele com pele entre a mãe e o bebê são duas recomendações para promover a amamentação propostas por estas organizações. O objetivo é, por um lado, favorecer e facilitar o início e manutenção da amamentação, por outro, promover a saúde do bebê.
Trabalhos anteriores mostraram que os bebês que iniciam a amamentação entre a segunda e a vigésima terceira hora de vida têm 33% mais risco de morrer do que aqueles que são amamentados na primeira hora, refere o relatório. Para os recém-nascidos (RN) que iniciam a amamentação um dia ou mais depois do nascimento, o risco de morte duplica. Os benefícios de iniciar precocemente a amamentação mantinham-se mesmo quando a criança não era amamentada em exclusivo (quando também bebia fórmula infantil, por exemplo).
A região que apresenta as melhores taxas de iniciação precoce da amamentação é a África oriental e do sul (65%). As piores taxas estão no Médio Oriente e norte de África (35%) e no sudeste asiático e Pacífico (32%). Vale a pena lembrar que os países com os rendimentos mais baixos, como as Filipinas, são aqueles onde as empresas de leite adaptado fazem ações promocionais mais agressivas para convencerem as mães a darem fórmula infantil aos bebês em vez de leite materno.
Curiosamente, o relatório não tem dados para os países desenvolvidos, como os países europeus, América do Norte ou Austrália. “A iniciação precoce da amamentação beneficia os recém-nascidos, independentemente de onde vivam”, reforça o relatório. “Ainda assim muitos países de rendimentos mais altos falham na vigilância deste indicador importante de nutrição infantil.”
No Brasil, só 42.9% iniciaram a amamentação na primeira hora.
Em Portugal, segundo dados de 2013 da Direção-Geral de Saúde, 84,1% dos bebés iniciaram o aleitamento materno na primeira hora de vida e 98% foi amamentado durante a permanência no hospital.
Nos países desenvolvidos, um em cada cinco bebês não foi amamentado
Ainda que não tenham dados de início da amamentação na primeira hora nos países desenvolvidos, a OMS e UNICEF dispõe de dados de bebês que não foram amamentados em nenhum momento das suas vidas. Nos países de rendimentos mais altos esta taxa chega aos 21%, enquanto nos países de rendimentos médios ou baixos é de apenas 4%. “Este intervalo significa que 2,6 milhões de crianças nos países de rendimentos mais altos estão a perder os benefícios da amamentação.”
“As mães não recebem apoio suficiente para poderem amamentar os seus bebês nos minutos cruciais após o nascimento, mesmo por parte dos profissionais de saúde”, diz Henrietta H. Fore, diretora executiva da UNICEF. Em alguns destes locais, o primeiro alimento dado aos bebês é fórmula infantil ou água com açúcar ou com mel. O primeiro leite da mãe — o colostro —, rico em nutrientes e anticorpos e essencial para a saúde do bebé, é muitas vezes desperdiçado.
Iniciar a amamentação na primeira hora de vida não é fácil: não se pode esperar que as mães consigam fazê-lo sozinhas”, escrevem os autores do estudo.
Ter acesso a melhores cuidados de saúde e à presença de um profissional qualificado durante o parto não significam, só por si, a promoção da amamentação, como refere o relatório. Por isso, a OMS e UNICEF recomendam que os bebês não sejam afastados das mães depois do nascimento (como ainda é uma prática comum), que se permita o contato pele com pele entre mãe e bebê e que os profissionais de saúde acompanhem o processo de amamentação para ajudarem as mães a identificarem e resolverem todos os problemas e limitações que enfrentem. Isto quer dizer que os profissionais de saúde devem verificar se a mãe está numa boa posição para amamentar, se está a posicionar corretamente no bebê e em que posições pode fazê-lo e, sobretudo, se o bebê está a pegar corretamente o mamilo e aréola, para conseguir extrair o leite que necessita sem machucar a mãe.
“Os bebés nascem preparados para mamar. O reflexo de mamar do recém-nascido permite mamar, engolir e alimentar-se assim que nasce”, escrevem os autores do relatório. A exceção está nos casos em que a gravidez não chegou ao fim naturalmente, como nos bebês prematuros, que ainda não têm força para mamar, e nas cesarianas que antecipam os partos — nem os bebês estão prontos para mamar, nem o corpo da mãe recebeu o sinal para começar a produzir leite. Mas mesmo nos casos das cesarianas, que não tenham outras complicações, é recomendado o contato pele com pele e a amamentação na primeira hora.
“O contato imediato pele a pele ajuda a regular a temperatura corporal dos bebês e permite que o seu corpo seja colonizado com bactérias benéficas da pele da mãe. Estas bactérias ‘boas’ fornecem proteção contra doenças infeciosas e ajudam os bebês a criarem o seu próprio sistema imunitário.”
A OMS recomenda ainda que os bebês sejam alimentados exclusivamente com leite materno até aos seis meses, sem necessidade de fornecer nenhum outro líquido, nem mesmo água. Isto implica que a mãe amamente o seu bebê sem horário marcado, sempre que o bebê deseje e pelo tempo que o bebê determinar. Não só o leite mata a fome como também mata a sede. Dar água ao bebê tem dois riscos: primeiro, pode diminuir a fome dos bebês de estômago pequeno, depois, nos países onde é difícil encontrar água potável, constitui um risco acrescido para a saúde dos lactentes.
Adaptado para o português brasileiro por Marcus Renato de Carvalho.
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