QI (Coeficiente de Inteligência) é maior em CRIANÇAS AMAMENTADAS – Estudo científico
Impacto do aleitamento materno
no coeficiente de inteligência de crianças de oito anos de idade
Ana L. M. Fonseca a, Elaine P. Albernazb, Cristina C. Kaufmannc, Ivana H. Nevesd, Vera L. M. de Figueiredo e
a Pediatra. Mestranda, Programa de Pós-graduação em Saúde e Comportamento, Universidade Católica de Pelotas (UCPel), Pelotas, RS, Brasil
b Pediatra. Doutora em Epidemiologia pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) Pelotas, RS, Brasil. Professora Adjunta de Pediatria do Programa de Pós-graduação em Saúde e Comportamento, UCPel, Pelotas, RS, Brasil
c Doutora em Saúde e Comportamento, UCPel, Pelotas, RS, Brasil
d Graduanda de Psicologia, UCPel, Pelotas, RS, Brasil
e Doutora em Psicologia, Universidade de Brasília (UnB), Brasília, DF, Brasil
Resumo
Objetivo: O objetivo deste estudo foi determinar a influência do aleitamento materno na capacidade intelectual de crianças pertencentes a uma coorte de um país em desenvolvimento, controlando para os principais fatores de confusão.
Métodos: Foi realizado um estudo de coorte prospectiva com todos os recém-nascidos nos hospitais de uma cidade de porte médio e acompanhou-se uma amostra aleatória destes aos 30, 90 e 180 dias de vida e aos 8 anos. No acompanhamento foram avaliados diversos aspectos da amamentação e, aos 8 anos, foi realizada avaliação da capacidade intelectual geral aplicando-se o Teste de Raven. As análises estatísticas utilizaram Teste T, ANOVA e regressão linear e logística, considerando como associações estatisticamente significativas aquelas cujo valor de p foi inferior a 0,05.
Resultados: Aos 8 anos 560 crianças participaram da avaliação com o Teste de Raven. A média da pontuação das crianças no teste foi de 22,56 pontos com desvio padrão de 5,93. A diferença de médias entre os grupos em aleitamento materno ou não, aos seis meses, foi de 1,33 (p = 0,008). Permaneceram associadas ao desfecho, após regressão linear e logística, a cor materna e da criança, classe socioeconômica, escolaridade e tabagismo maternos e o aleitamento materno aos 6 meses de idade (p = 0,007).
Conclusões: As crianças que mamaram por seis meses ou mais tiveram melhor desempenho na avaliação intelectual geral, mesmo após ajuste para os principais fatores de confundimento.
Artigo
Introdução
A amamentação apresenta claros benefícios em curto prazo para a saúde infantil, principalmente redução da morbidade e mortalidade por doenças infecciosas.1-3 Por outro lado, ainda há alguma controvérsia sobre as consequências a longo prazo do aleitamento materno (AM). A Organização Mundial da Saúde publicou em 2007 uma revisão sistemática e meta-análise que avaliou benefícios em longo prazo do AM. Os autores concluíram que a amamentação pode contribuir para o desenvolvimento intelectual, porém sugerem que apenas observações em longo prazo podem fornecer uma estimativa mais precisa do impacto da amamentação no desenvolvimento cognitivo.4
Uma revisão de literatura, publicada por Jain, em 2002, tentou determinar o quanto a amamentação tem efeito benéfico sobre o intelecto. A pesquisa identificou 40 publicações e, destas, 68% concluíram que a amamentação promove a inteligência, porém muitos estudos apresentavam falhas metodológicas. Apenas dois com recém-nascidos a termo apresentavam boa qualidade e destes apenas um concluiu que o efeito da amamentação sobre a inteligência era significativo.5
O desempenho cognitivo de um indivíduo é um processo complexo e influenciado por diversos fatores de ordem genética e ambiental, que interagem entre si, e, muito provavelmente, o AM seja um destes fatores.6 Um processo crucial no desenvolvimento neuronal é a mielinização que é muito rápida nos primeiros dois anos depois do nascimento e, a partir daí, continua em ritmo mais lento durante a infância e durante a adolescência.7 Sabe-se que o ácido araquidônico (AA) e o ácido docosa-hexaenóico (DHA) são importantes componentes lipídicos para o desenvolvimento das membranas celulares, especialmente das células da retina e do sistema nervoso central. Estes ácidos graxos de cadeia longa estão presentes no leite materno, mas não na maioria das fórmulas lácteas infantis.8 O AA e o DHA se acumulam no cérebro e na retina mais rapidamente durante o último trimestre da gestação e nos primeiros meses após o nascimento.4
O lactente precisa de suficiente estimulação e previsibilidade em seu ambiente para maximizar o período inicial de rápido crescimento e plasticidade cerebral. Uma dieta inadequada ou uma significativa falta de estimulação – principalmente estimulação verbal – nos primeiros meses podem acarretar efeitos negativos sobre o progresso cognitivo posterior da criança.7 Além das propriedades químicas o AM aumenta o vínculo entre mãe e bebê, o que pode contribuir para o desenvolvimento intelectual da criança.4
Há fortes indícios na literatura,4,9 porém ainda não conclusivos, de que o AM promove o desempenho cognitivo. Estudos randomizados não são viáveis do ponto de vista ético, o que dificulta a comprovação (ou não) desta associação. A grande maioria dos estudos foi realizada em países desenvolvidos, estudos em países em desenvolvimento para verificar essa associação ainda são escassos. Este estudo teve como objetivo avaliar, em uma coorte de nascimentos, a relação entre o AM e o desempenho intelectual das crianças aos 8 anos de idade.
Métodos
Foi realizado um estudo de coorte prospectivo que incluiu todos os nascimentos ocorridos em todos os hospitais da cidade de Pelotas no período de setembro de 2002 a maio de 2003 e acompanhou uma amostra aleatória de 30% destes aos 30, 90 e 180 dias de vida e aos oito anos de idade. Foram incluídos no estudo todos os recém-nascidos de mães residentes na zona urbana de Pelotas, sem contraindicação ao AM (exemplo: malformações graves ou mãe HIV positivo). Como o objeto inicial do estudo de coorte era avaliar aspectos da amamentação, foram excluídos os recém-nascidos que necessitaram de internação hospitalar logo após o nascimento e que permaneceram por mais de 24 horas longe de suas mães.
A amostra da coorte inicial foi baseada em um nível de confiança de 95% e um poder estatístico de 80%, para exposições variando entre 15 e 80%, e tinha se estimado um acréscimo de 15% no cálculo inicial para possíveis perdas e controle de fatores de confusão em potencial. Para as associações avaliadas aos oito anos, foi realizado cálculo a posteriori, mostrando a necessidade de uma amostra de 436 crianças. O Projeto de Pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Católica de Pelotas e as mães ou responsáveis assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Na visita dos oito anos, tentaram-se localizar as crianças que residiam em Pelotas ou que haviam mudado para municípios vizinhos através dos dados da última visita (endereço ou telefone), de busca através do sistema de informações do Pronto Socorro Municipal e do controle de internações do maior hospital da cidade, além de busca na internet, redes sociais e lista dos alunos matriculados no município. Foram consideradas perdas as crianças que não foram localizadas após 3 tentativas no endereço da última visita nem nas estratégias descritas. Foram excluídas da avaliação de desenvolvimento as crianças com diagnóstico clínico de retardo mental ou com síndromes que poderiam levar a atrasos no desenvolvimento (crianças que não conseguiram realizar o teste), ou ainda com alguma intercorrência clínica grave que impedisse a realização da avaliação da inteligência. A amostra localizada foi comparada com a amostra original, não tendo havido diferença estatisticamente significativa entre a amostra pretendida e a disponível.
As variáveis independentes foram obtidas através de coleta de dados do prontuário materno e também através de questionário padronizado aplicado às mães ou cuidadores por entrevistadores treinados, durante as visitas domiciliares. A classe socioeconômica foi definida de acordo com a classificação da ABEP.10 A renda familiar foi referida pelo entrevistado em valores em reais, a escolaridade dos pais foi considerada em anos completos de estudo com aprovação e a idade dos mesmos foi referida em anos completos de vida. A cor da pele foi avaliada através da descrição do entrevistador em branca e não branca. A presença de tabagismo materno e do companheiro foi referida pelo entrevistado. Dados sobre o sexo da criança, cor, número de filhos da mãe, peso do nascimento e idade gestacional foram obtidos do prontuário materno, quando do nascimento da criança. A idade gestacional foi obtida através do melhor dado disponível no prontuário (data da última menstruação, ecografia obstétrica ou de acordo com as características físicas do recém-nascido (Método de Capurro) e posteriormente categorizada em: prematuro (< 37 semanas) e recém-nascido a termo (≥ 37 semanas). O peso do nascimento foi categorizado em baixo peso (< 2.500 g) e adequado (≥ 2.500 g). Dados sobre AM foram coletados em todas as visitas e a variável "aleitamento materno" foi analisada de acordo com a duração do aleitamento e com as categorias preconizadas pela OMS,11 sendo que aleitamento materno aos seis meses foi considerado recebimento de leite materno, diretamente do seio ou extraído, independente de estar recebendo qualquer alimento ou líquido, incluindo o leite não humano. Os entrevistadores eram acadêmicos do curso de Medicina.
Para avaliar a capacidade intelectual geral foi utilizado o teste “Matrizes Progressivas Coloridas de Raven”,12 adaptado ao contexto brasileiro. Este teste é indicado para avaliar o desenvolvimento intelectual na escola, em diagnósticos clínicos e em estudos interculturais e antropológicos. É constituído por três séries de 12 itens: A, Ab e B. Os itens estão dispostos em ordem de dificuldade crescente em cada série, sendo cada série mais difícil que a anterior. Os itens consistem em um desenho ou matriz com uma parte faltando, abaixo do qual são apresentadas seis alternativas, uma das quais completa a matriz corretamente. O examinando deve escolher uma das alternativas com a parte que falta.13 O teste foi aplicado de forma individual, em uma segunda visita domiciliar específica para sua aplicação e as respostas eram anotadas pelo entrevistador em folhas de resposta padronizadas. Para análise, foram consideradas as pontuações brutas obtidas pelas crianças no teste (podendo variar de 1 a 36 acertos). Esta pontuação foi transformada em percentil conforme tabela de referência para correção no manual do teste12 onde: Percentil ≤ 5 significa intelectualmente deficiente, entre 6 e 25 abaixo da média na capacidade intelectual, entre 26 e 74 intelectualmente médio, entre 75 e 94 acima da média na capacidade intelectual geral e acima de 95 intelectualmente superior. Posteriormente foram categorizados em 3 grupos: Percentil ≤ 25 abaixo da média ou intelectualmente deficiente, entre 26 e 74 intelectualmente médio e ≥ 75 acima da média na capacidade intelectual ou intelectualmente superior. Os testes eram aplicados por acadêmicos do curso de Psicologia e foram treinados por uma psicóloga com experiência na aplicação do mesmo.
Foi realizado controle de qualidade através da aplicação de um questionário sintetizado a uma amostra aleatória de 10% de todas as crianças, com o objetivo de avaliar a qualidade e veracidade dos dados coletados. Para a análise dos dados foi utilizado o programa Epi-Info 6.0 e o pacote estatístico Stata 11.0. O modelo teórico, detalhado na figura 1, foi criado considerando a relação hierárquica entre as variáveis para identificar possíveis fatores de confusão na análise dos dados.
Figura 1 Modelo teórico.
Inicialmente foram obtidas as frequências das variáveis independentes para caracterizar a amostra do estudo. Depois foi realizada análise bivariada entre os fatores de exposição e o desfecho utilizando teste T para exposições dicotômicas e ANOVA para exposições ordinais. Para a análise multivariável foram utilizadas regressão linear (para avaliação do desfecho como média) e regressão logística (quando este foi avaliado de forma dicotômica: Percentil < 75 versus ≥ 75, caracterizando capacidade intelectual abaixo da média ou média versuscapacidade intelectual superior) e foram mantidas no modelo as variáveis com p < 0,10 por serem consideradas fatores de confusão em potencial. Ao final da análise somente as variáveis com p < 0,05 foram consideradas associadas ao desfecho de maneira estatisticamente significativa.
Resultados
No período do estudo nasceram 3449 crianças, das quais 81% residiam na zona urbana de Pelotas. Aos 30 dias, foram acompanhadas 951 crianças (2,3% de perdas); aos 90 dias, 940 (3,4% de perdas) e, aos seis meses, 931 (4,3% de perdas). Os resultados desses acompanhamentos estão descritos em publicação anterior.14 Aos oito anos 616 crianças foram localizadas, sendo que, 560 participaram da segunda visita para aplicação do teste de Raven. Foram excluídas da avaliação: 38 (6,2%) crianças que não foram localizadas após três tentativas, 8 (1,3%) que apresentavam alguma doença ou intercorrência clínica que impedisse a realização do teste e 10 (1,6%) que recusaram.
Dos 560 binômios acompanhados, 296 (52,9%) mães amamentaram seus bebês até pelo menos o sexto mês de vida. Cerca de metade da amostra 247 (44,1%) recebeu aleitamento materno exclusivo até o terceiro mês de vida e, apenas, 45 (8%) mães amamentaram seus filhos por menos de 30 dias. Aos seis meses apenas 88 (15,7%) crianças estavam recebendo aleitamento materno exclusivo. Não foi encontrada diferença estatisticamente significativa nas taxas de aleitamento aos seis meses entre as diferentes classes sociais (p = 0,47) e os diferentes níveis de escolaridade materna (p = 0,88).
As características sociodemográficas e econômicas da amostra, assim como outros dados maternos e infantis encontram-se na tabela 1. Em relação à idade gestacional, 89,5% das crianças eram a termo e quanto ao estado nutricional, aos 8 anos, 51,4% eram eutróficos.
Na avaliação com o teste de Raven 43 (7,7%) crianças estavam intelectualmente abaixo da média ou intelectualmente deficientes. A média da pontuação das crianças no teste foi de 22,56 pontos com desvio padrão de 5,93 que, para a faixa etária, corresponde a um percentil 60, ou seja, intelectualmente na média.
Na análise bivariada, as seguintes variáveis não foram associadas de forma significativa ao desfecho: idade da mãe (p = 0,98) e do pai (p = 0,95), sexo da criança (p = 0,25), escore Z para o peso (p = 0,30), idade gestacional (p = 0,19) e presença de companheiro materno (p = 0,08) não sendo apresentadas em tabela. As associações estatisticamente significativas estão detalhadas na tabela 2. Não foi observada associação significativa entre aleitamento materno exclusivo aos um, três e seis meses com o desempenho das crianças no teste.
Foram incluídas na análise multivariável as variáveis: renda familiar, classe socioeconômica, escolaridade da mãe e do pai, cor da mãe, situação marital, número de filhos, tabagismo materno, trabalho materno fora de casa, cor da criança, peso do nascimento e AM aos seis meses de idade. Permaneceram associadas ao desfecho a cor da mãe e da criança, classe socioeconômica, escolaridade da mãe, tabagismo materno e AM aos 6 meses (p = 0,007).
Ao avaliar o desempenho de forma dicotômica, as crianças amamentadas por seis meses ou mais obtiveram melhor desempenho no teste (RP = 1,26; p valor 0,01). Na regressão logística, ajustando para as variáveis citadas no parágrafo anterior, a medida obtida foi de 1,30, p-valor de 0,01 (tabela 3).
Discussão
Este estudo avaliou a capacidade intelectual geral através da aplicação do Teste de Raven em 560 crianças pertencentes a uma coorte de nascimentos da cidade de Pelotas. Os artigos disponíveis na literatura utilizam diversos tipos de testes para avaliar inteligência. Para este estudo o Teste de Raven12 foi escolhido por ser de fácil e rápida aplicação (15 a 20 minutos) favorecendo a participação e por ser indicado para determinar o desenvolvimento intelectual em estudos.13
Em 1999, Anderson et al. realizaram uma meta-análise para avaliar o efeito do AM no desenvolvimento cognitivo de crianças. Foram incluídos 11 estudos na análise que utilizaram diferentes tipos de testes para medir o coeficiente de inteligência. O desfecho utilizado foi a média da diferença nos escores dos testes entre os grupos em AM ou não. O resultado encontrado foi uma diferença de médias de 3,16 (IC 95% 2,35-3,98) no coeficiente de inteligência a favor do AM, porém os autores sugeriram que 2,0 a 2,4 pontos de diferença nos escores dos testes entre os grupos (que receberam AM ou não) se devem a fatores de confusão, sendo esta a maior limitação do estudo.9 No presente estudo, a diferença de médias encontrada entre os grupos em aleitamento materno ou não, aos seis meses, foi de 1,33 (p = 0,008). E ficou mais evidente o efeito do aleitamento ao comparar-se o desempenho no teste, classificando em percentis e avaliando este de forma dicotômica: as crianças amamentadas tiveram um risco 30% maior de serem classificadas como tendo capacidade intelectual acima da média quando comparadas com as que foram desmamadas antes dos seis meses. Entretanto, não foi observada associação significativa entre tipo de aleitamento materno, se exclusivo ou não, com o desfecho.
Este estudo demonstrou que a amamentação até o sexto mês de vida promoveu um aumento da capacidade intelectual, mesmo após ajuste para fatores de confusão. Uma vantagem em relação a outras investigações sobre o mesmo tema é que por tratar-se de um estudo de coorte, eliminouse o viés de memória sobre os dados do aleitamento materno que foram coletados prospectivamente.
No que se refere aos melhores escores alcançados por crianças cujas mães não fumavam e que apresentaram adequado peso de nascimento, os achados são semelhantes aos de outros estudos. Porém, ao contrário de alguns autores,15 não foi encontrada associação entre a idade gestacional e melhor desenvolvimento cognitivo. Isto se justifica porque o objetivo inicial do estudo de coorte era avaliar dados sobre amamentação e, portanto, foram excluídos do seguimento os bebês que necessitaram de internação hospitalar logo após o nascimento e que permaneceram mais de 24 horas afastados de suas mães. Portanto, os bebês prematuros que fizeram parte da amostra foram justamente aqueles nascidos próximo ao termo ou que não necessitaram de cuidados hospitalares por mais tempo.
Um estudo na Austrália com 302 crianças não encontrou associação entre a duração do aleitamento materno e o coeficiente de inteligência (QI) das crianças. A qualidade do ambiente doméstico foi o mais forte preditor de QI aos quatro anos de idade.16 Apesar de não ter sido realizada avaliação da capacidade intelectual das mães, no presente estudo, a escolaridade materna manteve-se associada diretamente com o desfecho, mesmo após ajuste para fatores de confusão. Apesar de não ter avaliado diretamente a qualidade do ambiente doméstico, as crianças cujas mães trabalhavam fora de casa obtiveram maior pontuação no teste. Observou-se, também, apenas uma tendência de apresentar melhor capacidade intelectual entre as crianças que tinham a presença do companheiro materno no convívio familiar (p = 0,08).
Um estudo observacional, publicado em 2006, objetivou avaliar a influência do QI materno no QI das crianças. Foi utilizado um banco de dados de uma coorte do ano de 1979 realizada nos EUA. Após ajuste para fatores de confusão e para o QI materno, o aleitamento representou um pequeno e não significativo aumento na capacidade intelectual das crianças.17 Apesar de não ter sido realizada avaliação da capacidade intelectual das mães, no presente estudo, a escolaridade materna manteve-se associada diretamente com o desfecho, mesmo após ajuste para fatores de confusão.
Uma das limitações do estudo foi o grande número de perdas em relação à visita anterior, mas, apesar disto, a amostra visitada aos oito anos foi representativa da população original. Outra limitação foi não ter incluído um questionário que pudesse avaliar déficit de atenção, que pode ter prejudicado a interpretação dos resultados nas crianças que atingiram baixa pontuação.
O diferencial deste estudo é que, foi um dos pioneiros a ser realizado em nosso país e, mesmo após ajuste para possíveis fatores de confusão, permaneceram associados ao desfecho importantes marcadores socioeconômicos e o aleitamento materno aos seis meses de vida. Este achado vem fortalecer as recomendações da Organização Mundial de Saúde de encorajar as mães para que amamentem seus filhos, principalmente no primeiro ano de vida,18 pois se sabe que além das características físico-químicas do leite materno, o contato pele a pele, a estimulação física e o olhar da mãe para o bebê são significativamente mais elevados durante o AM comparados com a alimentação artificial.19
O aleitamento materno, além de fortalecer o vínculo entre a mãe e seu bebê e trazer benefícios já bem documentados à saúde infantil, mostra que também contribui para a capacidade intelectual geral, mesmo entre aqueles com menores condições socioeconômicas. Portanto, a amamentação deve ser ainda mais estimulada nos países em desenvolvimento onde as crianças estão expostas a vários riscos, entre os quais o de apresentarem uma alta prevalência de doenças, o de nascerem de gestações desfavoráveis e/ou prematuras e o de viverem em condições socioeconômicas adversas.20,21
Leia o artigo completo no Jornal de Pediatria:
Eidelman AI. Breastfeeding and cognitive development: is there an association?. J Pediatr (Rio J). 2013;89:327-9.