O profissional de saúde como cuidador e,
por isso, um escutador
Atualmente, os profissionais de saúde são treinados a prescrever, informar, responder corretamente questões de vida ou morte. Sob tais exigências, frequentemente o profissional recebe pouca instrução sobre uma atividade totalmente diversa, mas igualmente fundamental: a de ouvir seus pacientes.
Rubem Alves nos fala: “O que as pessoas mais desejam é alguém que as escute de maneira calma e tranquila. Em silêncio, sem dar conselhos, sem que digam: se eu fosse você…”
Saber ouvir é uma habilidade rara, e há cursos para se aprender a fazê-lo: a técnica é chamada “Aconselhamento” (“counseling” ou “consejería”).
Aconselhamento não é dar conselhos: é compreender, assessorar, fortalecer a autoconfiança e autoestima de quem nos procura. Aconselhamento é uma postura – escuta-se com as mãos, com um toque, um gesto, com a respiração, com um olhar, inclusive com os ouvidos!
Aprender a ouvir sem julgar, sem levar sustos e sem ditar regras é um desafio.
Há várias barreiras que dificultam essa ponte comunicativa: o jaleco branco; o “mediques”; o computador (que às vezes está interposto); a mesa que separa; a diversidade cultural humana…
Devemos continuar sendo experts em nossas especialidades, dominar os procedimentos diagnósticos e as modalidades terapêuticas – devemos, sim, saber o que estamos falando. Contudo, os pacientes precisam de alguém que realmente os escute. Trata-se, afinal, de suas vidas – e o paciente acredita, com razão, que não há ninguém mais autorizado que ele mesmo a falar da própria vida.
Há uma comunicação não verbal que pode ser útil como por exemplo: mantenha sua cabeça no mesmo nível de quem você está atendendo; preste atenção; remova barreiras; não interrompa; dedique tempo; toque de forma apropriada (se for o caso); não atenda o telefone; não fique escondido atrás do monitor do seu computador, não preencha os formulários enquanto escuta, entre outras.
Devolver ao paciente o que ele disse demonstra que compreendemos o que ele falou. Uma simples assentida de cabeça, um sorriso ou um “Ahã”, “Mm”, “Sei”.
Aconselhamento é uma postura, uma atitude de empatia, é diálogo. E diálogo é ouvir a despeito do que se quer falar.
Outra dica: evite palavras que soam como julgamento ou desdém. Exemplos: você agiu mal; você fez errado; foi inadequado; houve uma falha; parece infeliz; isto não é nada; é realmente um problema. Oriente ao invés de corrigir.
Aceite o que o paciente pensa e sente: primeiro reconheça e elogie o que ele estiver fazendo melhor; ofereça ajuda prática; dê pouca e relevante informação; use linguagem simples e comente uma ou duas sugestões.
E veja como é interessante: você pode aplicar esta “técnica” em outras situações, com seu companheiro, com seus filhos, com seus sócios. Você verá que dar ouvidos vale a pena!
“Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas
mas ao tocar uma alma humana,
seja apenas outra alma humana.”
Carl Jung
*Marcus Renato é docente da Faculdade de Medicina – UFRJ. Especialista pelo International Board Certified Lactation Consultant. Mestre em Saúde Pública pela FioCruz, editor do site www.aleitamento.com
Agradeço a Bacharel em Letras e acadêmica de Medicina da UFRJ Nayara Alves pelas críticas e sugestões ao texto.
Convite
Oficina de Introdução à Prática do Aconselhamento em Amamentação: inscrições abertas em http://www.aleitamento.com/curso/
Publicado originalmente em http://clinimkt.com.br/clinicando/convidado/o-medico-como-cuidador-e-por-isso-um-escutador/#comments