Práticas perdidas da amamentação
que precisamos normalizar
Gabrielle Gimenez*
Muitas mães são assombradas pelos médicos que dizem que amamentar durante uma nova gravidez aumenta o risco de aborto, e orientam o desmame imediato³. O argumento é de que amamentar libera ocitocina e a ocitocina provoca contrações uterinas. Mas essa orientação não procede, já que a musculatura uterina só fica sensível à ação da ocitocina no final da gestação, por ocasião do trabalho de parto. Ter relações sexuais também libera ocitocina e nem por isso os médicos proíbem a gestante de transar. E, portanto, também não deveriam proibir de amamentar.
Após o nascimento do bebê, é comum escutar críticas sobre a “regressão” no comportamento do mais velho, ou que ele estaria roubando o leite do mais novo. Ou ainda, que amamentar em tandem aumentaria o risco de contágio entre os irmãos. Nada disso faz o menor sentido. Voltar a demonstrar mais interesse pelo peito após a nova apojadura é perfeitamente normal. A natureza é sábia e produz sob demanda e não vai faltar leite para nenhum dos dois. Além disso, se a criança mais velha estiver doente e mamar, os anticorpos produzidos pelo organismo da mãe serão transmitidos ao bebê mais novo via leite materno.
Sim, existem desafios na lactogestação e no tandem. Com acesso à boa informação e apoio efetivo é possível superá-los. Muitas mulheres persistem porque acreditam que os benefícios compensam as dificuldades. Temos crianças nutridas e imunizadas, temos um vínculo preservado entre a mãe e o filho mais velho, menos crises de ciúmes e o fortalecimento do vínculo entre os irmãos, tudo isso mediado pela amamentação.
A decisão final sobre o desmame ou a continuidade da amamentação sempre será da mulher. Infelizmente, muitos profissionais e grande parte da sociedade têm dificuldade de entender isso.
¹Lactogestação é amamentar durante uma nova gravidez.
²Tandem é amamentar duas crianças de idades diferentes, o irmão mais velho e o bebê que acabou de nascer. É a sequência natural da lactogestação.
³ Aborto? Numa gestação normal, também chamada de baixo risco ou risco habitual, a continuidade da amamentação não representa maior risco de aborto ou parto prematuro, não afeta o desenvolvimento fetal, não prejudica a saúde do bebê maior que ainda mama, nem a saúde da mãe, conforme evidências científicas. A lactogestação, do ponto de vista metabólico, não representa maior esforço do que uma gravidez gemelar.
Madarshahian F, Hassanabadi M. A comparative study of breastfeeding during pregnancy: impact on maternal and newborn outcomes. J Nurs Res. 2012;20(1):74-80. doi:10.1097/JNR.0b013e31824777c1
*Gabrielle é mãe de três, editora especial do portal aleitamento.com e autora do livro
“Leite Fraco? – Guia prático para uma amamentação sem mitos”.