,Essa II Oficina será, exclusiva – grupo fechado
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Se eu fosse você,
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 ,  ,  ,  ,  ,  ,  ,  ,  ,  ,  ,  ,  ,  ,  ,O que as pessoas mais desejam é, algué,m que as escute de maneira calma e tranquila. Em silê,ncio. Sem dar conselhos. Sem que digam: ",Se eu fosse você,",.
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A gente ama nã,o é, a pessoa que fala bonito. É, a pessoa que escuta bonito. A fala só, é, bonita quando ela nasce de uma longa e silenciosa escuta. É, na escuta que o amor começ,a. E é, na nã,o-escuta que ele termina.
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Nã,o aprendi isso nos livros. Aprendi prestando atenç,ã,o. Todos reunidos alegremente no restaurante: pai, mã,e, filhos, falató,rio alegre. Na cabeceira, a avó,,
com sua cabeç,a branca. Silenciosa. Como se nã,o existisse. Nã,o é, por nã,o ter o que dizer que nã,o falava. Nã,o falava por nã,o ter quem quisesse ouvir. O silê,ncio dos velhos.
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No tempo de Freud as pessoas procuravam os terapeutas para se curarem da dor das repressõ,es sexuais. Aprendi que hoje as pessoas procuram os terapeutas por causa da dor de nã,o haver quem as escute. Nã,o pedem para ser curadas de alguma doenç,a. Pedem para ser escutadas. Querem a cura para a dor da solidã,o.
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Acho bonito o taoí,smo, filosofia oriental.
Para saber como ele é, basta ler os poemas de Alberto Caeiro. O taoí,smo é, um jeito de olhar para o mundo. Sã,o muitos os jeitos de olhar para o mundo. Cada jeito, cada mundo. O taoí,smo diz que o mundo é, feito de encaixes. Tudo vem aos pares. O que nã,o tem par nã,o existe. Tudo é, macho e fê,mea: yang, yin. Quando as duas partes do par se encaixam faz ",dac", – e a felicidade acontece.
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Para haver encaixe é, preciso que cada parte seja incompleta. Se as partes fossem completas os encaixes nã,o seriam possí,veis nem necessá,rios. Como num quebra-cabeç,a. Cada peç,a tem de ter um buraco. Esse buraco é, para nele se encaixar um ",pleno", da outra peç,a. Se tal buraco nã,o existir, o encaixe nã,o pode acontecer. O quebra-cabeç,a fica frouxo, solto, desmancha.
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Mas nã,o acredite nessa palavra ",pleno",, que usei. Usei por falta de outra. ",Pleno", sugere algo completo, em que nada falta. Mas a verdade é, outra.
Todo ",pleno", é, um buraco visto pelo avesso. Quando o buraco e o pleno se juntam acontece o encaixe.
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(Quem já, montou quebra-cabeç,a sabe do prazer quase eró,tico que se sente ao fazer uma peç,a se encaixar na outra. Como se fosse uma metá,fora sexual. Confirmaç,ã,o do taoí,smo.)
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Viver é, montar um quebra-cabeç,a. Viver é, procurar encaixes.
Acho que os taoí,stas aprenderam isso observando a boca de um nenenzinho sugando o seio da mã,e. A boca é, um vazio. Sem nada saber ela já, sabe sobre os
encaixes. Suga o vazio. Seus movimentos rí,tmicos sã,o a primeira forma de oraç,ã,o, sem palavras. Oraç,ã,o é, o vazio que espera. A boca vazia ora pelo ",pleno", que a satisfará,: o seio da mã,e.
Mas o ",pleno", do seio da mã,e é, també,m oraç,ã,o: quer uma boca que o sugue. Quando boca e seio se encontram o encaixe acontece. É, a felicidade. O vazio de um é, o pleno do outro. O vazio de um é, a felicidade do outro.
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Assim é, o amor. A tristeza amorosa é, o vazio desejando o pleno. Só,crates inventou um mito para explicar o amor. Disse que Eros nasceu do casamento entre a ",Pobreza", e a ",Plenitude",. O amor é, um buraco na alma. Quem ama é, pobre. Falta alguma coisa. Peç,a desencaixada do quebra-cabeç,a. O sentimento amoroso é, a nostalgia pelo pedaç,o que me falta, ",pedaç,o arrancado de mim",. Assim sã,o o masculino e o feminino.
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O masculino é, o pleno que ora pelo vazio que o abraç,ará,.
O feminino é, o vazio que ora pelo pleno que nele se encaixará,.
Quando os amantes se abraç,am e as peç,as se interpenetram, os corpos se encaixam, como no quebra-cabeç,a. Todo ato de amor é, uma realizaç,ã,o efê,mera de uma unidade original perdida.
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Assim sã,o o yang e o yin, o pleno e o vazio, o seio e a boca, o masculino e o feminino, a fala e a escuta.
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A fala é, masculina: o pleno, sê,men, semente, penetraç,ã,o (podere, em latim, quer dizer cavar), ejaculaç,ã,o. Segundo o Auré,lio, essa palavra, ejaculaç,ã,o, que é, usada normalmente para designar o jato de esperma, significa també,m ",proferir, dizer em voz alta",. Ejacular esperma e falar sã,o a mesma coisa.
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O ouvir é, feminino. O pê,nis ereto é, uma pobreza. É, uma sú,plica, uma oraç,ã,o por uma vagina que o acolha. A semente, para germinar, precisa de um buraco na terra que a acolha. A fala é, pobre, falta. Procura o vazio do ouvido. A ejaculaç,ã,o da fala, masculina, acontece num momento. Mas a germinaç,ã,o da escuta, feminina, demanda tempo e silê,ncio.
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Para ouvir nã,o basta ter ouvidos. É, preciso parar de ter boca. Sá,bia, a expressã,o: ",Sou todo ouvidos",.
Todo ouvidos, deixei de ter boca. Minha funç,ã,o falante, masculina, foi desligada. Nã,o digo nada. Nem para mim mesmo. Se eu dissesse algo para mim mesmo enquanto você, fala seria como se eu começ,asse a assobiar no meio de um concerto.
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Faç,o, para ouvir você,, o mesmo silê,ncio que faç,o para ouvir mú,sica.
Vou agora lhe revelar o segredo da escuta.
Quando era iniciante na arte da psicaná,lise tratava de prestar a maior atenç,ã,o naquilo que o cliente me estava dizendo. Levou tempo para que eu percebesse que quem presta muita atenç,ã,o no que é, dito nã,o consegue escutar o essencial. O essencial se encontra fora das palavras.
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Fernando Pessoa, essa distraç,ã,o dos deuses, sabia disso e escreveu. Está, num poema que ele dirigiu a um poeta.
O poeta é, um falador. Constró,i objetos com palavras. A esse poeta, cujo negó,cio é, falar, ele diz:
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Cessa o teu canto.
Cessa, porque enquanto o ouç,o,
ouve a uma outra voz como que vindo
nos interstí,cios do brando encanto
com que o teu canto vinha até, nó,s.
Ouvi-te e ouvi-a
No mesmo tempo
E diferentes
Juntas a cantar.
E a melodia
Que nã,o havia
Se agora a lembro, Faz-me chorar.
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Preste atenç,ã,o no que está, escrito. Fernando Pessoa diz que a fala tem duas partes. A primeira sã,o as palavras que sã,o ditas: a letra. A segunda é, uma melodia que se faz ouvir nos interstí,cios da fala: a mú,sica. A letra é, coisa do consciente, cerebral. A mú,sica é, coisa do corpo, inconsciente. Aquilo a que a psicaná,lise dá, o nome de inconsciente é, a mú,sica do corpo. Quem diz a letra nã,o percebe que está, cantando.
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Tem havido tentativas de produzir uma fala que seja só, letra, sem a mú,sica. A ciê,ncia e a filosofia tê,m se esforç,ado por esse ideal – uma fala da qual o corpo
do que fala esteja ausente. Fala sem alma, só, informaç,ã,o. A voz metá,lica, monó,tona, indiferente, de robô,, dos serviç,os de alto-falantes dos aeroportos é,
uma expressã,o sensí,vel desse ideal desumano. Você, poderia imaginar um diá,logo de amor com essa fala?
Nã,o existe voz humana que nã,o tenha mú,sica.
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Aí, Fernando Pessoa diz que a letra nã,o tem importâ,ncia. Nã,o é, nela que se encontra aquilo que importa escutar. Pede até, ao poeta que pare de falar porque a fala dele atrapalha ouvir a melodia…
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Esse é, o absurdo segredo da escuta: é, preciso nã,o escutar o que se diz para se poder ouvir o que ficou nã,o-dito, a mú,sica. É, na mú,sica que mora a verdade daquele que fala.
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Assim, se você, quiser ouvir bem, nã,o preste muita atenç,ã,o na letra. Esqueç,a as liç,õ,es da hermenê,utica, a ciê,ncia da interpretaç,ã,o dos sentidos. Aprenda a sentir a mú,sica. Todos os tipos de mú,sica, do tam-tam dos tambores a Boulez. Porque o que os compositores fizeram foi só, fazer tocar em instrumentos aquilo que era tocado pelo corpo. Parafraseando Uexkü,ll:
",Todo corpo é, uma melodia que se toca.", Seria bom se, nos cursos de psicologia, se lesse menos livros e se ouvisse mais mú,sica.
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Fonte: livro do querido Mestre Rubem Alves &ndash, &ldquo,O Amor que acende a lua&rdquo, ,